30 maio, 2014

X-Men: Primeira Classe (X-Men First Class, AUS/GBR/EUA, 2011).

"Testemunhe o momento que transformará o nosso mundo" (Livre tradução da frase disposta no poster promocional do filme).
Após uma bem sucedida trilogia lançada nos anos 2000, eis que surgiu a "necessidade" de se dar novo gás a franquia X-Men (especialmente após o fiasco artístico apresentado em X-Men Origens: Wolverine, de 2009) e, ao invés de apostar numa sequência direta ou até mesmo num remake/reboot, os envolvidos resolveram apostar numa prequel, cujo foco reside na juventude de dois dos personagens mais destacáveis dos filmes anteriores: professor Charles Xavier (aqui interpretado por James McAvoy, de Em Transe) e Erik Lensherr, vulgo Magneto (composto por Michael Fassbender, de O Conselheiro do Crime). Contando com a direção do britânico Matthew Vaughn (Kick-Ass - Quebrando Tudo) e produção de Bryan Singer (figura responsável pela direção dos dois primeiros X-Men), X-Men: Primeira Classe representa uma nova e bem-vinda abordagem da franquia, especialmente por recortar o contexto dos filmes anteriores (obviamente, com menos ênfase no preconceito sedimentado entre a humanidade e destacando mais a descoberta da mutação em si) e aplicá-lo em uma época (literalmente) distinta, a década de 1960, imprimindo uma cara própria a produção, que brinca com a história ao conjugar eventos reais (como o conflito advindo da "invasão" da Baia dos Porcos pelos soviéticos) ao universo cinematográfico dos X-Men.

Não apenas esteticamente, mas estilisticamente é perceptível neste filme uma ruptura para com a trilogia anterior, ruptura essa que perpassa tanto o visual do filme quanto a construção da trama, tendo esta contornos mais "leves" que os demais filmes, além de possuir um senso de humor particular. Tudo isto, obviamente, trazido com pulso firme por Matthew Vaughn, que soube imprimir sua personalidade ao universo mutante, criando um filme com uma cara própria, sem necessariamente "sabotar" os demais.

Um dos elementos mais acertados do filme está na sua montagem (os responsáveis foram Eddie Hamilton e Lee Smith), que, ao lado de Vaughn, conseguiram condensar uma trama um tanto extensa - tanto devido ao grande número de personagens, quanto a sua própria ambição histórico-narrativa - sem negligenciar em excesso alguns de seus personagens e sem deixar o ritmo enfadonho, combinando bem sequências de ação a outras cujo foco reside com mais força no cômico ou no drama. Duas figuras são destaque em cada um destes segmentos: James McAvoy possui um ótimo timming cômico, enquanto Michael Fassbender (O Conselheiro do Crime) confirma mais uma vez sua magnetismo (desculpem o trocadilho) como ator, especialmente nas cenas de cunho dramático. A música de Henry Jackman (Capitão Phillips) servem bem a narrativa, escancarando as influências "bondianas" apresentadas por Vaughn durante a construção de várias sequências de ação e em especial a personalidade do personagem Sebastian Shaw, o grande vilão do filme, interpretado com propriedade por Kevin Bacon (O Homem Sem Sombra).

Visualmente o filme também mostra-se acertado, já que conta com um desenho de produção bastante interessante, que flerta com o "fantástico", mas sem deixar de referenciar as peças e obras dos anos 1960 - mérito do design de produção Chris Seagers, de Dèjá Vu) e encaixando-se muito bem ao estilo visual de Vaughn e do diretor de fotografia John Mathieson (Os Vigaristas). O desenho de som também se apresenta competente, porém os efeitos especiais já encontram-se "cansados", indicando até mesmo certo despreparo da equipe (apesar desta ter sido liderada pelo competente John Dykstra (vencedor do Oscar por Homem-Aranha 2) e confirmando a teoria de que o rateio de empresas de efeitos especiais digitais (pelo menos seis trabalharam no filme) acabam por contribuir sobremaneira para a irregularidade visual do filme. A falta de "realismo" de muitos dos efeitos não chegam a prejudicar o andamento e o gosto pelo filme, mas não deixa de ser um ponto baixo a ser destacado.

"Original" à sua maneira, X-Men: Primeira Classe representa um respiro mais que bem vindo a franquia mutante, especialmente após os dois últimos títulos pertencentes a esta, o irregular X-Men: O Confronto Final e o risível X-Men Origens: Wolverine. Construído com um clima mais próximo a uma matinê - não apenas pelo estilo 007 clássico empregado, mas pela época retratada em si (apesar do estado de periculosidade iminente -, mas sem deixar de debater assuntos sérios (o contorno aqui certamente é o mais político de todos os filmes da franquia), este reboot-sequência se enquadra, ao lado dos dois primeiros títulos, X-Men - O Filme e X-Men 2, como o melhor exemplar da série (quiçá o melhor dentre os melhores). Certamente alguns pequenos detalhes poderiam ter sido desenvolvidos de maneira ainda melhor (o filme sempre dá um salto de qualidade quando foca os personagens Xavier e Magneto, estejam estes juntos em cena ou não), mas talvez o fato de ter remexido tanto seu roteiro (o primeiro tratamento foi dado por Ashley Miller e Zack Stentz, baseado em um argumento proposto por Bryan Singer e Sheldon Turner e revisto por Jane Goldman em conjunto com Vaughn) tenha deixado algumas pequenas incongruências na ligação do enredo. Todavia, independentemente de um ou outro "vacilo", o produto final X-Men: Primeira Classe sagra-se como muito bom.


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09 maio, 2014

Fruitvale Station - A Última Parada (Fruitvale Station, EUA, 2013).

"O melhor filme no Festival de Sundance. Uma força cinematográfica incontrolável". (Peter Travers, da revista Rolling Stone).
Reverenciado desde sua estreia no Festival de Cinema de Sundance, Fruitvale Station - A Última Parada é uma grata surpresa, ainda mais por se tratar de um filme baseado em uma história real, o que vez ou outra engessa a obra, pelo excesso de reverência (ou seja, falta de um senso mais crítico ao objeto de estudo) ou pelo destaque em demasia a crítica, deixando assim a narrativa e o trato cinematográfico como um todo mais frágil (afinal de contas, conteúdo a parte, cinema é cinema). Estreando na direção de longa-metragem com um filme contundente, forte e com personalidade, Ryan Coogler empresta sua sensibilidade e técnica a história (real) de um jovem negro morto devido a excesso da força policial (a bem verdade, por um sujeito do corpo policial). 

Porém, o que mais chama a atenção não é a estupidez do fato, mas sim a construção do personagem principal, Oscar Grant (interpretado com propriedade e energia pelo promissor Michael B. Jordan, do sucesso Poder Sem Limites), que passa longe de representante bom mocismo e da marca de "cidadão de bem" vítima de um ato de "preconceito cego". Muito pelo contrário, o personagem é imaturo, irresponsável, condenado pela justiça e adúltero, mas isto não anula o fato de ser também um lutador, (bom) pai e, por que não, esperançoso. É justamente esta construção profunda de personalidade - mérito do texto de Coogler, mas também da composição inspirada de B. Jordan - e história de vida que distingue o filme de um típico filme-denúncia, pois o que é apresentado aqui é bem mais complexo e, por isso mesmo mais interessante, que outras obras cujo objeto de estudo perpassa o binômio justiça/injustiça (lembro-me com tristeza de um filme nacional que guarda alguns ecos com esta obra norte-americana, mas cuja realização acabou por materializar-se simplória, pouco interessante, até mesmo rasa; a obra em questão é Jean Charles, longa-metragem lançado em 2009, dirigido por Henrique Goldman e estrelado por Selton Mello e Vanessa Giácomo).

A construção do filme é muito bem realizada, pois esta aposta no desenvolvimento pontual das personagens principais, ao mesmo tempo em que vai construindo a premissa, fazendo com que o espectador seja conduzido ao trágico desfecho carregado de simpatia pelos personagens presentes. Não por que estes sejam "bonzinhos" ou heroicos, longe disso, mas sim por estes serem "demasiadamente humanos", como atesta a obra de Nietzche. É justamente a questão da falibilidade humana, além do foco no homem comum, rodeado por pessoas comuns e envolto com decisões deslocadas e acertadas, que dão naturalidade a trama, que conquista o espectador paulatinamente, fazendo com que este até "esqueça" a tragédia do porvir.

Tecnicamente o filme segue a "linguagem" dos filmes independentes cujo escopo perpassa pela estética de documentário. Logo, temos aqui muita câmera na mão, enquadramentos "invasivos" e planos "menos" elaborados. A diretora de fotografia Rachel Morrison (Sound of my Voice) realiza um bom trabalho, dando uma cara de "realidade" ao longa, além de mostrar competência principalmente no quesito iluminação, mas quem se sobressai mesmo é Ryan Coogler, já que é este o responsável por orquestrar toda a produção e transformar uma tragédia em uma obra ao mesmo tempo de protesto e de esperança.

Ganhando corpo conforme vai sendo desenvolvido, Fruitvale Station - A Última Parada é um filme de argumento forte, cuja crítica incomoda por ser "na cara", tendo seu desfecho o poder-dever de despertar repulsa não apenas para com o sistema no qual nos encontramos amarrados, mas também (e principalmente) ao assinalar o quão pequeno, nauseante, decepcionante e ignóbil pode ser o ser humano. A relação de poder e o preconceito étnico-racial também ganham corpo no obra, sem que esta se furte em desenvolver um "herói" falho e possivelmente contraventor, mas nunca inumano, nunca explorador do outro, nunca desonesto para com si mesmo. Eis um filme que deveria ter sido contemplado com indicações ao Oscar (cabia a lembrança de filme e ator, no mínimo), mas cuja força foi abraçada pelo lado "artístico", como o Festival de Cannes, que contemplou Ryan Coogler com Un Certain Regard  - Avenir Prize, o Independent Film Awards, que o premiou como melhor filme e o Festival de Sundance, tendo sido escolhido como melhor filme tanto pelo júri, quanto pelo público. Prêmios nem sempre dizem tudo, mas no caso da obra de Coogler, acaba dizendo sim.

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03 maio, 2014

A Estranha Vida de Timothy Green (The Odd Life of Timothy Green, EUA, 2012).

"Ele é uma força da natureza" (Livre tradução da frase disposta no poster do filme).
Geralmente os filmes produzidos pelos estúdios Disney não são dos mais corajosos e inovadores, como também não deixam de lado a marca (mácula para uns poucos) de moralismo, inspiração e quê de autoajuda. Em compensação, a magia externalizada por suas obras certamente é um diferencial e, mesmo que vez ou outra o tiro acabe saindo pela culatra, quando um filme Disney contagia, contagia de verdade e A Estranha Vida de Timothy Green, felizmente, pende para o bom lado de produção Disney.

Dono de uma estada discreta nos cinemas - salvo engano, por aqui foi lançado direto no mercado de home-video -, o filme escrito e dirigido por Peter Hedges (Eu, Meu Irmão e Minha Namorada) é um misto de fábula e aventura que comove e chama a atenção. Sua trama (baseada na obra de Ahmet Zappa) tem um toque de O Curioso Caso de Benjamin Button, todavia, ainda mais lúdico e com uma pegada propositalmente infantil. As presenças de Jennifer Garner (Clube de Compras Dallas) e Joel Edgerton (O Grande Gatsby) dão certo peso à produção, mas quem chama a atenção é o jovem CJ Adams (que participa do vindouro Godzilla), garoto que esbanja carisma ao interpretar o personagem título. Completam o elenco principal Rosemary DeWitt (O Casamento de Rachel), David Morse (Contato), Ron Livingston (Invocação do Mal), Shohreh Aghdashloo (X-Men: O Confronto Final) e Dianne Wiest (Hannah e suas Irmãs), que andava sumida das telas de cinema.

O filme é bem acabado tecnicamente, merecendo destaque o trabalho de John Toll (A Viagem) na composição de imagens e iluminação - o tom de verde prevalece durante quase toda a projeção, tendo a natureza grande destaque em seus enquadramentos - e o design de produção discreto, mas eficiente apresentado por Wynn Thomas (Uma Mente Brilhante) e equipe. Os responsáveis pelos efeitos especiais e maquiagem também realizam um bom trabalho, sendo interessante apontar o veterano Greg Nicotero (Hitchcock, série The Walking Dead) como um dos destaques. Mesmo discreto, os temas apresentados pelo compositor Geoff Zanelli (Gamer) ajudam à construção da narrativa (especialmente a escancarar o lado "sentimental" da obra.

Certamente A Estranha Vida de Timothy Green não é um filme impecável, muito menos constrói algo que possa ser considerado como "novo" ou "inusitado", mas o casamento entre premissa criativa (mesmo que, vez ou outra, possa ser sentido alguns tropeços na narrativa) e mensagem edificante (ora bolas, o filme é mais do que um incentivo a paternidade/maternidade) resulta agradável, talvez pela entrega do elenco (sim, a leveza do mesmo encaixa muito bem a abordagem do longa) ou até mesmo pelo esmero de Hedges na construção da obra. Em algumas momentos a obra pode perder um pouco do fôlego (nem sempre o tom fantástico parece acertado), mas a mensagem defendida pelo filme é tão bem construída (sem acabar soando piegas) que os possíveis problemas narrativos acabam ficando em segundo plano. No mais, um bom (bom mesmo) filme para toda a família.

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02 maio, 2014

Loucamente Apaixonados (Like Crazy, EUA, 2011).

"Eu quero você. Eu preciso de você. Eu te amo. Eu sinto a sua falta. Como louco(a)" (Livre tradução do texto disposto no poster promocional do filme).
 Grande vencedor do Festival de Cinema de Sundance - o filme levou o prêmio do júri -, Loucamente Apaixonados é um romance que segue a escola intimista e documental estabelecida por Antes do Amanhecer (e suas continuações), de Richard Linklater, com um toque de pessimismo do cineasta Derek Ciafrance, especialmente no seu trabalho mais conhecido, Namorados para Sempre. Dirigido e co-escrito por Drake Doremus (Douchebag) - o outro roteirista é o também ator Ben York Jones -, a obra faz um apanhado direto de um relacionamento à distância. Problemática que ganhou novas cores na contemporaneidade - hoje, além das várias possibilidades de deslocamento, temos a Internet e as inúmeras ferramentas de telecomunicação como instrumentos indispensáveis para a consecução de tal sonho -, a análise realizada por Doremus e York Jones mostra-se acertada e acaba sendo coroada pelas performances convincentes da dupla de atores principal, Anton Yelchin (Star Trek) e Felicity Jones (Histeria).

Apesar de não apresentar grandes mudanças em sua trama e apostar numa narrativa cronológica e direta, o filme consegue manter o espectador interessado aos desencontros provocados ou não pelos personagens principais. É perceptível que houve muito improviso por parte de Yelchin e Jones na construção dos diálogos, o que deu um maior toque de naturalidade ao relacionamento entre seus personagens. A direção de Doremus parece optar por intervir o mínimo possível na dinâmica dos atores, investindo sua energia na composição de cena - este, ao lado do diretor de fotografia John Guleserian (Questão de Tempo), enquadram algumas cenas belíssimas - e na ambientação. Loucamente Apaixonados pode ter um ritmo lento e não ousar na construção da trama e em seu desenvolvimento, mas o assunto (e a forma) abordado e o carisma de seus personagens (especialmente a dupla principal) são mais do que suficientes para manter a atenção do espectador, que certamente acabará "conectado" com o casal protagonista. É válido destacar a presença discreta - mas acertada - de Jennifer Lawrence (O Lado Bom da Vida), aqui pré-Oscar e Jogos Vorazes, que confirma seu talento mesmo com pouquíssimo tempo de tela.

Custando a bagatela de 250 mil dólares - e faturando pouco mais de três milhões mundialmente -, Loucamente Apaixonados é um drama romântico antenado aos anseios de parte da geração atual que não se furta em entregar um trabalho coeso, sem necessariamente entregar um ponto final a trajetória de seus personagens. Há muito choque de egos e vontades entre estes e alguns caminhos tomados parecem tanto caminhar para a congruência entre eles, como também provocar uma cisão. O final aberto dá um toque especial ao longa e, mesmo que tal decisão não seja hoje mais novidade, acaba dando ao filme um tempero a mais, pois convida o espectador à reflexão acerca não apenas do romance entre os personagens de Yelchin e Jones, mas principalmente da estrutura montada para se viver um relacionamento à distância.

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