29 abril, 2013

Oblivion (EUA, 2013).

"A Terra é uma memória pela qual vale a pena lutar" (Livre tradução da frase disposta no poster do filme). 
Uma das ficções-científicas mais esperadas do ano - ainda teremos Depois da Terra, de M. Night Shyamalan (A Vila) e Elysium, de Neill Blomkamp (Distrito 9) -, Oblivion consegue resgatar muito do estilo cinematográfico do gênero nos anos 1970, especialmente no que se refere ao ritmo compassado e ao valor de produção, já que inquestionavelmente este filme tem como maior destaque o seu visual, desde a fotografia clean, esplendorosa e servente à narrativa (a bem verdade, é praticamente um dos protagonistas da obra) do chileno Claudio Miranda (O Curioso Caso de Benjamin Button), passando pelo figurino funcional e bonito, sem deixar o aspecto futurista/realista de lado, até chegar ao fascinante desenho de produção, que transmuta de forma efetiva o estilo "appleniano" de hoje no nosso possível futuro de algumas décadas a seguir. Caso fosse uma fotografia, Oblivion certamente seria um clássico, contudo, numa obra cinematográfica o aspecto visual puro conta apenas metade do jogo, visto que a narrativa, o desenvolvimento da trama/personagens e a finalidade da produção abarcam a outra metade e, apesar de ter um saldo bastante positivo, o filme tropeça em alguns momentos ao tentar desenvolver sua trama, o que acaba por não permitir que este ascenda a condição de referência.

Comandado pelo promissor diretor de Tron, o Legado, Joseph Kosinski, e estrelado pelo sempre disposto Tom Cruise (Jack Reacher - O Último Tiro), Oblivion parte da premissa de que o planeta Terra  teve de ser abandonado devido à escassez de recursos naturais após uma guerra entre humanos e extra-terrestres (guerra esta que foi "vencida" pela humanidade) e nele encontramos apenas duas pessoas - as personagens de Cruise e Andrea Riseborough (Não Me Abandone Jamais) -, que possuem a missão de "fiscalizar" o planeta, que apesar da vitória dos residentes ainda sofre alguns ataques dos ditos rebeldes. O plot em si não é dos mais originais, mas recicla com cuidado alguns dos elementos mais frequentes das obras de ficção-científica, especialmente daquelas de cunho mais crítico. Há na trama do filme elos de ligação com obras como 2001: Uma Odisseia no Espaço, Matrix, Wall-E e até mesmo Missão:Marte, mas quase tudo no limite do aceitável, apesar de uma ou outra referência aparecer de forma excessiva (vide 2001, por exemplo).

Certamente há mais méritos do que deméritos no filme escrito por Kosinski, Karl Kadjusek (Reféns) e Michael DeBruyn, como o fator isolamento das personagens de Cruise e Riseborough (que gera margem a algumas discussões de cunho contemplativo-existencial), o tom pontual de mistério acerca do que acontece no então inóspito planeta Terra, além do viés reflexivo da trama em si, que se não apresenta pontos de vista diferentes dos já bastante debatidos em outras obras cinematográficas ou literárias, os condensa de forma eficiente, gerando curiosidade e empatia para com as duas personagens e o ambiente nos quais estas vivem. Em contrapartida, parece que os roteiristas não organizaram muito bem as ideias a serem apresentadas, tornando o filme um tanto instável, ora redundante - a narração introdutória de Cruise é repetida como diálogo durante o filme, o que gera certo incômodo - ou simplesmente confuso, como no apressado desfecho, que de tão preocupado em referenciar 2001, de Stanley Kubrick e Arthur C. Clarke, acaba um tanto indigesto, pois o que até então parecia simples e lógico, torna-se deveras confuso e ilógico, fator este que reputo à pressa e a possível inexperiência dos envolvidos na construção da obra (escrever uma obra de ficção-científica com alto grau de profundidade não é para qualquer um).

Se os aspecto narrativo e conceitual derrapam um pouco, o quesito atuação e direção dão certo respiro a Oblivion. Enquanto Kosinski consegue, de certa forma, imprimir sua marca como cineasta, optando por uma construção visual contemplativa e pausada, dando espaço à geografia futurística terrestre e ao magistral desenho de produção, além de se sair bem nas cenas de ação, mesmo que estas sofram de pouca inspiração, Tom Cruise mais uma vez comprova que é sim um ator diferenciado, pois apresenta disposição tanto nas cenas que exigem um pouco mais do seu trato físico - é impossível não sorrir quando nos é mostrado uma cena em que seu personagem, Jack Harper, surge correndo numa espécie de esteira do futuro -, quanto nas de caráter mais subjetivo, onde o ator transparece as camadas de dúvida e solidão de seu personagem de forma sutil e crível. Certamente, por ter maior tempo de tela, seu personagem acabou sendo bem mais desenvolvido que o de Riseborough ou de Olga Kurylenko (007 - Quantum of Solace), mas isto não tira o mérito da boa interpretação do astro.

Apesar da boa premissa e do resultado final como um todo ser acima da média, o grande barato do filme encontra-se no seu aparato visual. É simplesmente deslumbrante o trabalho do desenhista de produção Darren Gilford (Tron, o Legado) e do diretor de arte Kevin Ishioka (Avatar) - além de seus auxiliares Todd Cherniawsky (Guerra dos Mundos) e James Clyne (Star Trek) -, que criam um mundo crível,  interessante, mas atrativo e inóspito ao mesmo tempo, que auxiliado à fotografia imersiva, profunda e contemplativa de Claudio Miranda, nos deixa embasbacados com a organicidade a cada cena do filme. Soma-se a isso os efeitos visuais pontuais e competentes, temos então uma obra de visual poderoso, que convence como um possível futuro do início ao fim. Destaco também a ótima trilha sonora composta em parceria por M.8.3., Anthony Gonzalez e Joseph Trapanese, que apesar de beberem muito da fonte do Daft Punk na trilha do filme Tron, O Legado (influência de Kosinski?), especialmente pelo uso maciço de instrumentos sintetizados, casa bem com o filme, pontuando os climas e a proposta da obra como um todo. 

Um bom respiro a uma onda de filmes pouco inspirados de ficção-cientifica ou retóricos em demasia - não poderia deixar de cutucar Prometheus, de Ridley Scott -, apesar dos excessos e da perda de direcionamento em alguns momentos, além de possuir uma certa gordura no desenvolvimento de sua trama (sinceramente, o arco dos "rebeldes" tem tão pouco destaque e contribui tão pouco para o cerne do filme que poderia muito bem ser apenas sugerido, deixando assim pistas para uma possível sequência; além do mais, precisava mesmo contratar Morgan Freeman e Nicolaj Coster-Waldau para pontas tão insignificantes?), Oblivion é uma obra interessante, visualmente brilhante e que pelo menos tenta proporcionar alguns momentos de reflexão, mesmo que, no fim das contas, puramente pessoais/subjetivas. A ambição do filme foi bem maior do que seu resultado na prática, mas nem por isso tornou-se uma obra ruim ou fraca, mas certamente a "desqualificou" para a categoria essencial, ficando assim no meio do caminho para a classificação de obra-referência de sci-fi.
  
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28 abril, 2013

Homem de Ferro 3 (Iron Man 3, EUA, 2013).


Primeiro filme da Marvel Studios após o furacão Os Vingadores, Homem de Ferro 3 possuía a dura missão de, não apenas manter o nível de interesse (e frenesi) daqueles que foram conquistados pela reunião dos heróis da Marvel, mas também de superar (este é o verbo motriz de Hollywood) o sucesso de crítica e público (este, principalmente) dos dois capítulos anteriores, sendo que desta vez a produção não conta com a direção de Jon Favreau (que continua envolvido na franquia como ator e produtor). Incredulidade e esperanças à parte, o certo é que Homem de Ferro 3 coroa muito bem a já excelente trilogia, apresentando uma fórmula parecida com as dos filmes anteriores, mas sem medo de evoluir tanto a trama, quanto (e principalmente) a personagem Tony Stark, realizando assim um recorte inteligente e interessante entre a óbvia redundância das histórias em quadrinhos e os objetivos da Marvel Studios para o seu leque de personagens no universo cinematográfico.

Assumindo a função de diretor e responsável pelos retoques no roteiro (o roteirista principal foi Drew Pearce, criador da série britânica No Heroics), Shane Black (Beijos e Tiros) consegue superar todas as expectativas e realizar um trabalho conciso, bem amarrado e dinâmico, ou seja, sem deixar nada a dever aos filmes (e estilo) de Jon Favreau, sem que tivesse que deixar de lado suas características como realizador (o humor e tensão do filme carregam sim um quê de obras anteriores escritas pelo aqui diretor, como o primeiro Máquina Mortífera). É óbvio que em produções deste quilate geralmente é de competência do diretor de segunda unidade (ou até mesmo terceira) o comando da maioria das sequências de ação, contudo, isto não tira o mérito e o olhar aguçado do diretor, que teoricamente possui voz para escolher as melhores cenas, além de direcionar a forma com que deseja que tais cenas sejam filmadas. Com isso quero deixar registrado que o filme possui ótimas sequências de ação, em sua maioria perfeitamente inteligíveis e, à exceção da sequência climática final, que carrega um pouco demais nos exageros (não atrapalha, mas também não se apresenta essencial), cumpre seu papel de termômetro entre os dois filmes anteriores do personagem e o primeiro d'Os Vingadores.

O elenco do filme mantém o alto nível dos dois anteriores, escalando bons atores em papeis secundários e apostando em um clima que nivela o humor e as fanfarronices heroicas/vilanescas dos mesmos. Retornam, além de Robert Downey Jr. (Zodíaco) e Gwyneth Paltrow (Shakespeare Apaixonado), Don Cheadle (Crash - No Limite) e o já citado Favreau. Somam-se a estes Ben Kingsley (A Invenção de Hugo Cabret), Rebecca Hall (O Despertar), James Badge Dale (O Voo) e Guy Pearce (Os Infratores), movimentando assim o já excepcional elenco. Não cabe a mim apresentar detalhadamente as personagens destes últimos, até por que muitos são revelados durante o andamento da trama, o que poderia causar certo mal estar em você, leitor, mas asseguro que, todos estão muito bem em seus respectivos papeis, contudo, não há como não destacar a personalidade e, por que não, diversão proporcionada pelas interpretações de Kingsley e Pearce, atores estes de grande capacidade e talento e que, nos últimos anos, voltaram a aparecer com mais destaque em grandes produções.

Muito se discutia acerca da provável "seriedade" deste Homem de Ferro 3, especialmente pela exploração dramático dos trailers do filme, todavia, apesar de haver um certo rompimento para com o clima "rock and roll" dos dois primeiros filmes - inclusive, não há uma música sequer do AC/DC aqui -, a pegada de diversão é mantida, mas a trama retoma um pouco a temática bélico-terrorista do primeiro episódio e isso, aliado ao prosseguimento do desenvolvimento de Tony Stark (Downey Jr.) como ser-humano, acarreta em um filme igual e diferente, ao mesmo tempo, dos demais. Ao meu ver, o que Shane Black e cia. fizeram foi dar um passo à frente na condição do personagem, referenciando o passado deste (tanto os filmes anteriores, quanto Os Vingadores tem relação umbilical com este filme, apesar de não ser necessário, de forma alguma, conferi-los antes dele), ao mesmo tempo em que não há medo algum em dar um passo a frente, evoluí-lo, torná-lo um tanto menos inconsequente (daí a limagem na caracterização rock and roll?), mais maduro, mas nem por isso menos divertido. Há um equilíbrio entre humor, ação, discussão e referencias ao universo das histórias em quadrinhos que faz com que Homem de Ferro se torne um filme tão bom, completo e agradável quanto os anteriores. A saga do "ferroso" pode se enaltecer de ser um caso raro, em que todos os seus filmes são, quase que indiscutivelmente, muito bons.

É inegável o valor de produção de Homem de Ferro, pois é possível enxergar para onde foram tantos milhares de dólares (ao contrário de Thor e Capitão América, por exemplo, que ainda apresentavam certas fragilidades visuais). As armaduras de Tony Stark estão cada vez mais perfeitas e as sequências de ação, apesar do ritmo frenético - não tanto quanto em Os Vingadores, mas frenéticas -, são bem pensadas e, principalmente, "acreditáveis", visualmente falando. A equipe de cenografia também merece parabéns, especialmente pela caracterização do vilão Mandarim (Kingsley), que surge ao mesmo tempo ameaçador e referencial, tendo suas vestes papel preponderante à ótima caracterização do veterano ator inglês. No campo sonoro, o filme também se destaca, pois certamente, no que o visual (3D ou não) deixar escapar, os efeitos sonoros cumprem a tarefa de imergir o espectador na confusão (no bom sentido) despertada pelo filme. Como ponto abaixo da média destacaria a trilha sonora composta por Brian Tyler (Os Mercenários, Os Mercenários 2), que à exceção da utilização do tema da série, surge na maior parte do tempo exagerada e "alta" demais, apostando em um clima épico e grandioso que, sinceramente, não é abraçado pelo filme. Creio que Tyler se animou um pouco demais com a responsabilidade e acabou por construir uma trilha ainda mais exagerada do que a proposta do filme.

Equilibrado em quase todos os sentidos, Homem de Ferro 3 sobrevive sem a presença de Jon Favreau e seus roteiristas, dá prosseguimento à saga do herói de armadura e nasce como um filme tão (ou até mais, por que não) bom e eficiente quanto os demais. Temos aqui um Robert Downey Jr. bastante a vontade (como não?), um enredo interessante e divertido, personagens coadjuvantes que esbanjam carisma, efeitos visuais de última geração, além de muito humor e aventura. O que pedir mais? Uma evolução gradativa das personagens. Ora bolas, esta ocorre. Sendo assim, apesar do verão blockbuster norte-americano estar apenas em seu início, já temos em Homem de Ferro 3 um grande candidato a melhor filme na categoria, mas de forma natural e harmônica, sem nenhuma (ou quase nenhuma) forçação de barra ou pirotecnia exacerbada. Certamente este não é um filme perfeito, mas suas falhas são plenamente compensadas pelo conjunto da obra, que pode ser considerada como bem mais do que eficiente, pois beira a magia da despretensão e do divertimento casual, o que é ou não é o objetivo primeiro de uma obra leve de entretenimento? Pense nisso!

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27 abril, 2013

O Príncipe do Egito (The Prince of Egypt, EUA, 1998).

"Às vezes, para o bem de muitos, sacrifícios têm que ser feitos" (fala do Faraó Seth ao seu filho adotivo, Moisés).
"Nenhum reino deve crescer as custas de escravos" (fala de Moisés à seu irmão adotivo, Ramsés I). 
Adaptação do Êxodo bíblico, a animação O Príncipe do Egito pode se considerar vitoriosa em pelo menos dois aspectos: primeiramente, por condensar de forma eficaz os eventos registrados nas passagens bíblicas, com grande força metafórica - apesar das licenças poéticas e do viés mercadológico, o que em nada inibe sua qualidade artística - e, segundamente, por traduzir esta história de maneira épica e dinâmica, caráter este essencial as animações ocidentais pós-Disney.

Dirigido pelo trio Simon Wells (A Máquina do Tempo), Brenda Chapman (Valente) e Steve Hickner (Bee Movie), o filme sagra-se vitorioso ao abraçar como fulcro central o relacionamento entre as personagens Moisés (voz original de Val Kilmer, de Beijos e Tiros - a versão dublada em português teve a voz de Guilherme Briggs) e seu irmão de criação (e futuro Faraó), Ramsés (Ralph Fiennes, de 007 - Operação Skyfall), pois a complexidade destas, especialmente por representarem os viéses político, cultural, social e religioso de seus povos (hebreus e egípcios, respectivamente) torna a obra bastante rica conceitualmente, mesmo que vez ou outra impere certa redundância ou exagero narrativo no material, fato este no mínimo comum, já que este produto possui como um de seus públicos-alvo a criançada.

Tecnicamente a animação continua espetacular, possuindo uma união bastante interessante entre as técnicas de animação tradicionais à época somadas a algumas incursões de elementos em 3D, o que guardou certo charme a produção. Tratado desde o início como um épico musicado (ou musical), toda a escolha de ângulos e planos da animação evocam um tom heroico e espetacular dos grandes épicos bíblicos das décadas de 1940, 1950 e 1960, como Os Dez Mandamentos e Ben-Hur, além de beber bastante do estilo de animações lançadas temporalmente próximas a O Príncipe do Egito, como O Rei Leão e Pocahontas, por exemplo.

No âmbito musical não há muito o que se comentar, além do registro de que o filme é brilhante. Tendo como condutores o maestro Hans Zimmer (Batman, o Cavaleiro das Trevas) e o letrista e compositor Stephen Schwartz (Encantada), as canções da animação reforçam com unicidade o caráter épico do filme, ajudando a contornar certas "falhas" do enredo - afinal de contas, são resumidos em pouco mais de uma hora e meia décadas de conflitos - e contribuindo de forma efetiva à narrativa do filme. Afora isso, funcionam muitíssimo bem fora do escopo da obra, já que são canções belas, imponentes e com melodias grandiosas, complementadas por mais um trabalho de competência de Zimmer na orquestração e desenvolvimento dos temas do filme.

Apesar de não tão lembrado quanto as clássicas produções da Disney e não estar elencada - pelo menos, não oficialmente - como um dos pilares da DreamWorks Animation, O Príncipe do Egito conquistou um bom público à época (sagrou-se bem sucedida nas bilheterias mundiais), recebeu um Oscar (melhor canção original: When You Believe) e conquistou um vasto séquito de fãs, porém parece ter sido esquecido nos dias de hoje, o que é uma baita de uma injustiça, a contar a qualidade técnica e de conteúdo da obra. Filme de cunho religioso que acerta ao não tentar à toda maneira catequizar ou comover de forma arbitrária o espectador, O Príncipe do Egito pode não ser uma animação perfeita, especialmente em termos de desenvolvimento narrativo, mas supera a maioria de seus obstáculos (quer queira ou não, esta é uma produção audaciosa de um texto "milenar") e sagra-se tanto como uma obra de entretenimento saudável, quanto uma adaptação primorosa de um capítulo histórico importante à humanidade.

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22 abril, 2013

A Entidade (Sinister, EUA, 2012).


"Uma vez que você a veja, nada poderá salvá-lo" (Livre tradução da chamada do poster).
Um bom filme de terror traz consigo duas coisas: sustos e tensão. Apesar de não alcançar o ápice em ambas as situações, A Entidade, de Scott Derrickson (O Exorcismo de Emily Rose) se sai muito bem como um filme de mistério e ocultismo, especialmente por seguir o caminho trilhado pelos grandes clássicos do gênero e apostar mais na sugestão do que na exposição das imagens. Trazendo um bom elenco - encabeçado pelo não muito valorizado Ethan Hawke (Antes do Amanhecer) - e apostando nos sustos efetivos - apesar dos efeitos sonoros e trilha cansados -, o filme sagra-se como um bom respiro a mesmice do gênero na última década e, mesmo não trazendo uma premissa inovadora narrativa ou tecnicamente, cumpre bem o papel de entreter através do medo.

Confesso que me sinto atraído por temas que envolvam ocultismo, magia negra, rituais afro e mitologias obscuras e, por abraçar em parte tais elementos o filme acabou despertando ainda mais interesse. Basicamente focado no relacionamento entre o escritor em baixa (Hawke) e sua família, recém-mudada para uma casa "vítima" de um terrível acontecimento, o mote principal da obra acaba resumida a dicotomia entre a curiosidade/obrigação da personagem de Hawke em realizar seu trabalho e sua posição de líder e pai de família, cuja missão primordial é proteger seus entes queridos. Obviamente, por seguir certas convenções, a personagem acaba demorando bastante até perceber que esteve mexendo com algo errado, mas sem esta ação desastrosa provavelmente não teríamos um filme de horror.

Realizado com um custo baixíssimo, A Entidade acerta por se tratar de um filme intimista, dono de um enredo de fácil assimilação e de um elenco carismático, que em nenhum momento se comporta de forma estereotipada ou falsa, reproduzindo, na medida do possível, comportamentos parecidos com os que qualquer pessoa tida como "normal" fariam caso passassem pelas provações apresentadas no longa. Porém, apesar do esforço em convencer o espectador de maneira natural, alguns elementos não casam tão bem ao filme, como os efeitos digitais da misteriosa "entidade" título e o excesso de ruídos e estrondos que, ao invés de auxiliarem o susto, acabam por antecipá-lo - falha narrativa - ou simplesmente anulá-lo. Creio que a cartilha do horror deva ser seguida, mas há coisas que não funcionam e a sonoplastia deste filme prova isso.

Escrito por Scott Derrickson e C. Robert Gargill, o roteiro do filme é um de seus pontos altos, não pela inovação em si, mas sim pela coerência e pelo jogo de cintura ao construir gradativamente tanto as relações entre as personagens que habitam a casa, quanto a resolução dos mistérios acerca desta. Um grande sucesso de bilheteria - cada vez mais Hollywood aposta na fórmula de produzir filmes de horror baratíssimos, mas com grande possibilidade retorno financeiro -, A Entidade é um entretenimento bacana, que investe bastante na sugestão e não tem "medo" de apostar em um desfecho um tanto pessimista. Não vai salvar o gênero - nem nunca o pretendeu -, mas também não ajuda a afundá-lo como tantos outros títulos lançados ultimamente.

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20 abril, 2013

A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty, EUA, 2012).


"A maior caçada humana da história" (Livre tradução da chamada do poster do filme).
Uma hora ou outra um filme acerca da caçada ao "maior" terrorista surgido nos últimos cinquenta anos teria que ser realizado e é justamente isto que é materializado no filme A Hora Mais Escura, da dupla vencedora do Oscar pelo filme Guerra ao TerrorKatheryn Bigelow e Mark Boal. Porém, apesar da premissa um tanto óbvia - quem, em santo juízo, não conhece mesmo que superficialmente a trajetória da caçada ao afegão Osama Bin Laden pelas autoridades internacionais, capitaneada pelos norte-americanos -, o estilo capitular e jornalístico empregado ao filme pela dupla destacada confere ao mesmo um clima de urgência e interesse bastante particular, ainda mais para uma obra formatada basicamente de diálogos e conflitos entre personagens do mesmo cerco, pois suas sequências de ação são deixadas apenas para os quarenta minutos finais.

Indo de encontro ao que a opinião pública - pelo menos aquela fora do seio norte-americano - achava da obra, todo o patriotismo e inferência ao poder de estandarte da democracia vendido pelos Estados Unidos da América é praticamente ignorado pelo filme, já que este se dedica - com muita competência - totalmente á construção e reconstrução das investigações acerca do paradeiro do então líder da organização criminosa Al Qaeda, sob os auspícios da jovem e determinada agente Maya, interpretada com precisão, delicadeza e sutileza pela atualmente queridinha da crítica Jessica Chastain (O Abrigo). É através dela que é canalizada a angústia, os medos e o sentimento de impotência do povo norte-americano, mas sempre de forma natural, muitas vezes palpável, tanto que é praticamente impossível não simpatizar com a personagem e sua dedicação incondicional à localização do covil do terrorista saudita, numa prova inconteste do grande trabalho que Chastain desenvolve à personagem.

É óbvio que a temática do filme é polêmica e gera discussões em todos os sentidos, até por que, mesmo que o viés crítico perdure durante toda a projeção, estamos falando de um filme americano que abraça um trauma/caçada de cunho basicamente emocional para àquele povo, então o mínimo seria esperar certo "romantismo" na abordagem, além das velhas conveniências narrativas que ligam o ponto A ou ponto B, de modo a despertar o máximo de emoção ao espectador, não importando se estas possuem caráter de realidade ou não. No mais, tratamos aqui de uma obra cinematográfica, que por si só possui suas regras e objetivos, dentre eles entreter, o que é cumprido com esmero pelos envolvidos. A bem verdade, mesmo que  construído como uma obra de ficção - baseada em fatos reais, mas ainda assim uma ficção -, A Hora Mais Escura carrega um caráter de "realidade" e compromisso que agregam bastante, seja pelo fato de traduzi-lo como um bom filme, seja como um bom registro de um evento sem precedentes à história moderna mundial.

Tecnicamente o filme é primoroso, desde a paleta de cores - que muda gradativamente conforme o beco que é a busca começa a apontar para uma saída inexistente - abraçada por Greig Fraser (O Homem da Máfia) até os efeitos sonoros (não à toa o filme recebeu o Oscar pela categoria edição de som, carregando a estatueta em conjunto com 007 - Operação Skyfall). A direção de Bigelow também é essencial ao filme como um todos, especialmente no que se refere a construção da tensão e urgência do filme, sem necessariamente utilizar da ação e da pirotecnia (que é relegada ao terceiro ato do longa, lá pelos quarenta minutos finais), assim como sua sinergia ao roteiro decupado pelo jornalista Mark Boal, que dá uma cara de documentário ao filme, mas sem exageros ou armadilhas pseudo-realísticas. A Hora Mais Escura é, acima de tudo, uma obra de ficção de entretenimento e é desta forma que acaba sendo formatada e conduzida, o que é um grande acerto.

Sofrendo o mal da pouca novidade (como disse no topo do texto, quem não conhecia fragmentos da trama do filme?) e possuindo uma duração um tanto longa (creio que a retirada de trinta minutos do filme não o fariam mal, mesmo sabendo que não há dispostas cenas que soem "descartáveis" à trama), A Hora Mais Escura pode acabar não agradando a alguns justamente pela sua "paciência" em construir à narrativa, dando grande importância a evolução da personagem Maya e aos meandros da agência de investigação norte-americana (CIA). Abraçando a tensão em detrimento da ação e contextualizando o espectador com informações precisas (pelo menos, no âmbito da ficção) acerca da caçada ao terrorista islâmico, A Hora Mais Escura consegue fugir do viés de exaltação patriótica e se concentra na exposição da história, construindo um vínculo de cumplicidade e respeito para com o espectador, o que faz com que o clímax da obra seja uma mais do que bem-vinda recompensa aqueles que a acompanharam, com interesse e paciência, todo o desenrolar operacional (e tantas vezes burocráticos) que culminaram com a invasão ao suposto esconderijo de Bin Laden, resultando em sua morte. O desfecho do filme, que apresenta a personagem Maya finalmente liberando as lágrimas que guardara por quase uma década, é uma metáfora acertada acerca do sentimento do povo norte-americano após a notícia da morte do líder da Al-Qaeda e, patriotismo à parte, finaliza o filme com competência e critério.

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11 abril, 2013

O Ditador (The Dictator, EUA, 2012).


O grande mal de O Ditador não se encontra em sua retórica extremista, em sua linguagem abusiva ou em sua narrativa apelativa. O grande problema do filme é que na maior parte do tempo ele não tem graça. Apesar de não ser tão expositivo quanto Bruno, filme anterior da dupla Larry Charles (diretor) / Sacha Baron Cohen (ator e co-roteirista), a obra que brinca com os clichês e, por que não, preconceitos do povo ocidental perante os "bárbaros" - muitos o são - do oriente médio tem boas sacadas e expõe com certa competência nossas impressões acerca dos governos do Irã e Arábia Saudita, por exemplo, mas a piada no entorno desse caldeirão de referências não é muito bem resolvida, soando ora tola demais, ora "intelectualizada" demais. O único meio termo é o riso contido emanado ao conferir qualquer uma destas.

É mais que sabido que o comediante e ator Sacha Baron Cohen é um cara criativo e pouco dado a sutilezas, porém aqui a impressão que se dá é que o mesmo foi podado em alguns momentos, talvez pela má recepção de seu filme anterior ou mesmo pela "delicadeza" do tema abordado desta vez. O fato é que o humor do filme não flui tão bem, mesmo que seja possível enxergar lampejos de criatividade à lá Borat, primeiro sucesso da carreira de Cohen (e, por sinal, seu melhor trabalho até então).

Tecnicamente não há muito o que se comentar, até por que o diretor Larry Charles aposta no convencional em sua abordagem visual, optando por destacar a personagem de Cohen em contraponto ao extravagante Estados Unidos da América (aos olhos desta personagem). Destacaria a fotografia do filme (a cargo de Lawrence Sher, de Se Beber Não Case), que explora bem a luz - dando ao filme um tom de fantasia/devaneio, por assim dizer - e a trilha sonora de Erran Baron Cohen (irmão de Sacha), que "sintetiza" com competência temas que remetem ao outro lado do hemisfério.

Contando com a presença de Anna Faris (franquia Todo Mundo em Pânico) e de sir Ben Kingsley (A Morte e a Donzela) em papeis menores, mas importantes à trama - apesar de achar o de Kingsley ridículo  -, além das pontas de John C. Reilly (Deus da Carnificina), Edward Norton (Clube da Luta) e Megan Fox (Transformers), O Ditador acabou não repetindo o sucesso de bilheteria dos dois filmes anteriores de Charles e Cohen, Borat e Bruno, mas isso não quer dizer que este seja ruim ou descartável. Infelizmente, seu maior problema é justamente o cerne de seu gênero e o fato de uma comédia não ter tanta graça pesa bastante, contudo algumas boas intenções, somadas a coragem do tema, fazem deste um entretenimento agradável, mesmo que pouco engraçado.

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08 abril, 2013

Medidas Desesperadas (Desperate Measures, EUA, 1998).


Pouco visto e bastante criticado à época de seu lançamento, o thriller dramático Medidas Desesperadas, de Barbert Schroeder (O Reverso da Fortuna), apesar de vez ou outra cair nas armadilhas da obviedade do suspense genérico, mostra-se um filme envolvente e interessante, muito disso devido ao clima de urgência apresentado por Schroeder, mas principalmente pela forte carga dramática empregada por seu elenco, especialmente o camaleônico Michael Keaton (Jackie Brown), que aqui interpreta um condenado de QI elevadíssimo.

Com uma premissa que mistura melodrama (pai passa por cima de tudo para realizar um transplante de medula ao filho portador de câncer) e correria estilo gato e rato, Medidas Desesperadas é eficiente até o momento em que tenta exigir um pouco mais da irrealidade da trama, que funciona perfeitamente como uma metáfora acerca da luta infindável de um pai em busca da salvação de seu filho - o próprio título da obra corrobora isso -, mas que devido a algumas "conveniências" hollywoodianas e exageros por parte do roteiro do romancista David Klass (Com as Próprias Mãos), acaba por destacar demais essa "irrealidade" da premissa, tirando assim a imersão do espectador e, consequentemente, fazendo-o notar com mais facilidade as incoerências e rompantes de puro exagero do thriller. 

Contudo, apesar de irregular, a dupla principal de atores surpreende e se apresenta como o grande acerto do filme, a começar pelo eterno Beetlejuice Michael Keaton, que une caricatura à presença de cena para compor uma personagem construindo basicamente por clichês de vilania, mas que mesmo assim conquista o espectador, despertando curiosidade tanto pelas motivações da personagem, quanto pelo que o aguarda a partir de então. A outra cara da moeda, apesar de não brilhar tanto quanto aquele, é Andy Garcia (O Poderoso Chefão Parte III). Este, apesar de vestir a carapuça de mocinho irretocável, confere humanidade a personagem, especialmente no sentido de sugerir dúvida e fragilidade perante suas ações, como já é costumaz em grande parte dos trabalhos do ator. Incrementando o texto até então previsível com certa humanidade (Garcia) e imprevisibilidade (Keaton), a dupla eleva o nível do filme do lugar comum ao entretenimento contagiante, mesmo que o longa insista na auto-sabotagem em diversos momentos.

Com uma direção segura e técnica, todavia sem muito brilho ou surpresa, possuidor de uma trilha sonora pouco inspirada (a cargo de Trevor Jones,  de  O Último dos Moicanos - e, como na maioria dos thrillers e suspenses, exagerada -, mas que curiosamente apresenta alguns temas que remetem aos dos filmes do agente 007 - particularmente não entendi a referência, mas que há ecos dos longas de James Bond, isso há -, dono de um roteiro interessante, mas que se perde em meio a convenções e decisões previsíveis e com uma dupla de protagonistas inspirada e competente, Medidas Desesperadas, mesmo não sendo uma obra classuda ou imperdível,  pode ser considerado um eficiente filme de gênero, no qual as atuações se sobressaem aos devaneios da trama em si e que, no final das contas, proporciona bons momentos de entretenimento, bastando ao espectador apenas relevar alguns (poucos, mas constrangedores) exageros na narrativa da obra.

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