30 agosto, 2013

Os Penetras (BRA, 2012).


O que me fez querer conferir Os Penetras (que, na minha opinião, deveria se chamar "Os Vigaristas" ou "Os Golpistas", já que o mote do personagem de Adnet e cia. não é simplesmente "invadir" festas glamourosas, mas sim aplicar golpes) foi o fato do filme ser dirigido por Andrucha Waddington, realizador de filmes celebrados como Lope, Casa de Areia  e Eu, Tu, Eles, pois geralmente não me sinto atraído pela estética (e ética, por que não) das comédias comerciais brasileiras que aportam periodicamente nos cinemas, especialmente aquelas carimbadas pelo selo Globo Filmes (talvez a exceção sejam os filmes assinados pelo Claudio Torres, talvez), tanto pela estética televisiva de sua maioria, quanto pela falta de novidade de seus enredos, que passam longe da subversão ou da reverência aos clássicos, sendo a grosso modo bastante estéreis. Todavia, apesar deste Os Penetras ser um filhote da Globo Filmes, o fato de ter como idealizador o "autoral" Waddington e contar com a presença do talentoso Marcelo Adnet como protagonista dão um certo diferencial ao filme, que mesmo utilizando uma estrutura similar a de outros filmes da produtora carioca, consegue soar mais orgânico e interessante.

A trama recheada de desencontros escrita por Marcelo Vindicatto (O Palhaço) - baseada em argumento do próprio Andrucha Waddington - não sai do lugar comum, repetindo a velha história de encontro entre um trambiqueiro carioca (Adnet) e um jovem inocente do interior (Eduardo Sterblitch, o ponto fraco da dupla) participando de "altas aventuras" na alta sociedade carioca. Seria pequeno de minha parte afirmar que o filme se reduz a isso, pois é notório o tanto de improviso empregado ao roteiro por parte da dupla Adnet/Sterblitch, sendo os momentos de descontração do primeiro os de maior respiro do filme. Não sei quais seriam as influências de Adnet como ator/comediante, mas em sua composição de Marco Polo Azevedo (nome fantasia de seu personagem) vejo muito de Jim Carrey e Steve Carrell, dois dos mais competentes e versáteis comediantes cinematográficos das duas últimas décadas.

Como todo produto da Globo Filmes, as "participações especiais" (tal classificação só parece existir no Brasil, assim como "grande elenco") de nomes como Luiz Carlos Miele (A Casa da Mãe Joana), Luiz Gustavo (O Casamento de Romeu e Julieta), Andrea Beltrão (Salve Geral), Susana Vieira (Xuxa e os Duendes 2 - No Caminho das Fadas) e Stepan Nercessian (Memórias Póstumas) recheiam o caldo do filme, sendo alguns destes bem vindos, outros de pouca importância, todavia o que importa destacar é que a fórmula continua a mesma. Outro nome de relativa importância à trama é o de Mariana Ximenes (A Máquina), que compõe aqui a femme fatale, a melhor sedutora e misteriosa responsável por juntar os personagens de Adnet e Sterblitch. Pena que seu papel tem uma importância reduzida, sendo pouquíssimo desenvolvida, já que se apoia basicamente em seus atributos físicos.

Outro diferencial da produção encontra-se na técnica aplicada, pois, apesar de certos vícios narrativos, a composição do filme é mais cinematográfica que televisiva, muito graças ao bom trabalho do diretor de fotografia Ricardo Della Rosa (O Passado) e da montagem de Sérgio Mekler (Eu e Meu Guarda Chuva), que juntos adequam a estética e o ritmo do longa ao ambiente para o qual foi originalmente concebido: a sala de cinema. Logo, apesar da essência mista do projeto, a "pegada" cinematográfica prevalece, ajudando o fortalecimento do produto final do filme.

Inicialmente pensava que Os Penetras se tratava de uma versão tupiniquim das comédias norte-americanas atuais, especialmente do hit Penetras Bons de Bico, todavia, apesar de alguns ecos entre ambas as obras, Os Penetras tem cara própria, mesmo que aproximada da tendência atual das comédias nacionais. Espécie de "bromance" tupiniquim, o filme de Andrucha Waddington tem seus prós e contras, pois se formos analisarmos como o novo trabalho do diretor, certamente este ficaria entre os mais fracos de sua filmografia, mas visualizando-o como um produto encomendado (tem toda a cara), este até que não faz feio, pois consegue ser engraçado em diversos momentos (apesar do apático e super-estimado Eduardo Sterblitch), sem que para isso apele para o vocabulário chulo, as referências ultra-machistas ou o pastelão desenfreado (Sterblitch até tenta puxar esse lado, mas felizmente Adnet não entra na onda). Os Penetras não é um grande filme, mas diverte pontualmente (apesar das obviedades do roteiro), é tecnicamente bem elaborado e, sem sombra de dúvidas, supera qualitativamente a safra de comédias acéfalas nacionais dos últimos anos.

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29 agosto, 2013

Superman: Sem Limites (Superman: Unbound, EUA, 2013).


Nem sempre uma obra precisa ser visceral e profunda para contagiar, especialmente quando direcionada ao público jovem (infanto-juvenil) e traduzida sob a forma de desenho animado. Some-se a isso o fato desta ser baseada literalmente em uma história em quadrinhos escrita com a finalidade de agradar tal audiência, temos assim um produto final - em teoria - perfeito em sua formatação e finalidade. Superman Sem Limites, mais uma animação produzida pelo braço da Warner Bros. / DC Entertainment dedicado a este tipo de produção, segue o padrão de excelência do estúdio, tanto no âmbito estético quanto no que se refere à construção de seu roteiro, que compila com qualidade razoável as edições em quadrinhos em um longa-metragem de pouco mais de uma hora de duração. É certo que esta não se encontra entre as melhores animações produzidas pela DC Entertainment, mas ainda assim encontra-se acima do nível mediano.

Contando com a direção de James Tucker - que já havia trabalhado como diretor em algumas séries em animação da Warner, como Batman do Futuro, mas que estreia aqui em um longa-metragem - e com o roteiro de Bob Goodman (Batman, o Cavaleiro das Trevas Parte 1 e Parte 2), baseado na história em quadrinhos escrita e desenhada por Geoff Johns e Gary Frank, Superman Sem Limites pode ser resumida como um misto de história de origem -  a trama da primeira aparição do alienígena Brainiac, um dos maiores antagonistas do Superman - e porradaria clássica das HQs, pois apesar do enredo trazer elementos canônicos da mitologia do personagem título, em essência a abordagem dessa é mesmo a da aventura despretensiosa, com muitos combates e viagens espaciais. Ao contrário das últimas animações da DC, que adaptavam histórias consideradas clássicos (ou até mesmo jovens clássicos), esta animação abraça uma boa aventura, mas que não pode ser tida como irretocável ou obrigatória e talvez justamente por isto o produto final tenha saído tão interessante, já que pouco há para se comparar (particularmente não li a obra que deu origem a esta animação, mas acredito que não deva ser tão melhor que esta adaptação).

Como quase toda animação da DC, a escolha das vozes que interpretarão as personagens são de alta qualidade e aqui isto não poderia deixar de se repetir. Contando mais uma vez com Andrea Romano como diretora do elenco de vozes, Superman Sem Limites traz algumas novidades ao plantel, como o "clone" de Henry Cavill (o novo intérprete do Superman em live-action), Matt Bomer (Magic Mike), que aqui dá a voz ao personagem principal, Stana Katic (The Spirit: O Filme), como Lois Lane, John Noble (O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei) como o vilanesco Brainiac e  Molly C. Quinn (série Castle) como Supergir, além do retorno de Wade Williams (série Prison Break), que havia dublado o Comissário Gordon na adaptação de O Cavaleiro das Trevas e aqui interpreta o editor do Planeta Diário, Perry White. Todos encontram-se muito bem em seus respectivos papéis, mas dentre eles destacaria a força e postura de Noble e tomaria o trabalho de Bomer como uma grande surpresa, pois o mesmo constrói um Superman/Clark Kent para lá de carismático e inspirador, explorando muito bem seu personagem.

Como dito anteriormente, a trama de Superman Sem Limites não traz grande complexidade, nem possui uma mensagem ou sub-texto escondido, sendo basicamente uma aventura recheada de ação e de sequências literalmente explosivas, cuja missão final é a de reapresentar - no caso da animação, apresentar - um dos vilões mais icônicos da mitologia do homem de aço. Talvez o maior mérito desta produção seja a estruturação compacta e dinâmica de seu roteiro, que condensa de forma ao mesmo tempo acessível e inteligível a saga elaborada por Johns e Frank, sendo assim uma obra leve e essencialmente "quadrinhos", tal qual fora Superman/Batman: Inimigos Públicos e Superman/Batman: Apocalipse (ambas baseadas em histórias escritas por Jeph Loeb), mas cujo resultado final é, sem sombra de dúvida, muito melhor.

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27 agosto, 2013

Invasão a Casa Branca (Olympus Has Fallen, EUA, 2013).

"Quando nossa bandeira cair, nossa nação se levantar-se-á" (Livre tradução da frase disposta no poster promocional do filme).
O maniqueísmo exacerbado dá o ar da graça mais uma vez através do filme Invasão a Casa Branca (no original, Olympus Has Fallen, título que faz alusão à queda da Casa Branca). Certamente isto não é de todo ruim, pois esta abordagem casa bem com a premissa e o objetivo primeiro da obra. Infelizmente, esta opção também acaba por limitá-la, pois se por um lado esta é uma peça de entretenimento de massa instigante e cumpridora do beabá disposto no "manual do bom filme de ação", por outra acaba não saindo da zona de conforto e do lugar comum entre tantas obras outras que já abraçaram a temática tripartida terrorismo / invasão ao território norte-americano / "sequestro" do Presidente dos EUA. 

No âmbito geral o filme não faz feio, já que constrói seu arremedo de história focando principalmente na construção do relacionamento entre os personagens de Gerard Butler (Redenção) e Aaron Eckhart (Batman, o Cavaleiro das Trevas), a orquestração do clima de tensão provocada pela tomada da Casa Branca e, como não poderia deixar de ser, as grandiloquentes sequências de ação, que retomam o conceito oitentista do exército de um home só (prática já trabalhada anteriormente pelo diretor do filme, Antoine Fuqua, em O Atirador).

Esta pegada anos 1980 de  Invasão a Casa Branca remete de imediato a filmes como Duro de Matar (muitos, inclusive, o apelidaram de "Duro de Matar na Casa Branca"), mas enquanto as obras características daquela década estavam atrelados as concepções sócio-culturais vigentes daquele período, o filme de Fuqua apenas traz de volta aquele estilo narrativo, sem qualquer tipo de adaptação à nossa realidade - ora bolas, creio que, assim como o cinema, evoluímos nossas percepções, não é mesmo? Sendo assim, nada mais justo do que um pouco mais de verossimilhança aos nossos dias -, o que sob a redoma de um olhar mais crítico acaba tornando esta "homenagem" muito pouco para o potencial da obra como um todo.

O elenco do filme traz um punhado de grandes nomes (mesmo que a maioria não esteja mais em evidência hoje em dia), como Ashley Judd (Tempo de Matar), Robert Forster (Jackie Brown), Radha Mitchell (Melinda e Melinda), Melissa Leo (Oblivion), Angela Basset (A Cartada Final) e Cole Hauser (Duro de Matar: Um Bom Dia Para Morrer), além do "novato" Rick Yune (Ninja Assassino), que se sai muito bem como o vilão-terrorista do filme. Os demais citados também surgem bem, mas suas participações são tão reduzidas que pouco podem fazer para dar mais profundidade ou despertar mais interesse a seus respectivos personagens. Quanto ao trio principal, formado por Butler, Eckhart e Freeman, pode-se dizer que o primeiro se sai bem como astro de ação - a bem verdade tais papeis se encaixam melhor ao ator que suas tentativas dramáticas ou românticas -, enquanto o segundo empresta uma aura de dignidade e perseverança que quase sempre é relacionado ao líder de Estado do país mais poderoso do mundo, além do seu físico representar de forma mais do que simbólica o perfil do líder nato norte-americano. Já o último entrega mais uma interpretação sem grande brilho - Freeman vem de uma série de pequenos papeis nos últimos dois ou três anos -, mas mesmo assim consegue roubar algumas cenas, como por exemplo àquela em que põe o Genera interpretado por Robert Forster em seu devido lugar. Curiosamente Freeman acaba por interpretar uma vez mais um presidente dos Estados Unidos.

O roteiro dos estreantes Creighton Rothenberger e Katrin Benedikt, apesar de previsível e pouco profundo (o tom político empregado ao filme é raso demais), é bem estruturado, construindo seus três atos com propriedade, funcionando bem como um longa de ação, enquanto Antoine Fuqua prova que é um competente diretor de filmes de ação, conduzindo com destreza visual tanto as sequências de ação mais elaboradas, quanto aquelas onde o clima de suspense sobressai. A bem verdade, quanto ao âmbito técnico-visual do filme, o único elemento que deixa a desejar é a computação gráfica empregada nestas sequências de ação, que variam muito em termos de qualidade, muitas vezes sobressaindo a má. Outro elemento que incomoda bastante é a trilha sonora composta por Trevor Moris (Imortais), pois esta surge "alta" demais em quase todo a projeção do filme, além de exagerar na caracterização patriótica - inclusive em momentos mais intimistas, que pediria uma abordagem mais leve -, com muitas marchas em tons altamente pomposos.

Invasão a Casa Branca é uma obra de entretenimento rasa cuja suposta discussão acerca da periculosidade do terrorismo organizado internacional em solo norte-americano não é bem sustentada pelo seu roteiro e cujo protagonista (Butler), uma espécie de John McLaine melhor treinado, parece ter tido como motivação primeira não o restabelecimento do status quo americano ou salvaguardar a vida do Presidente dos EUA, mas sim obter de volta seu antigo cargo e posição privilegiada como membro da guarda oficial daquele (tal impressão é passada pelo desfecho do filme, quando Fuqua faz questão de destacar o personagem com um sorriso de satisfação pela retomada do posto). Por outro lado, deixado um pouco de lado tais incongruências conceituais, Invasão a Casa Branca é bem filmado, possui um punhado de cenas de ação instigantes e consegue divertir em suas quase duas horas de duração, funcionando como um (bom) genérico de Duro de Matar - ainda não vi o quinto capítulo da franquia, mas muitos comentam que é mais fraca que este filme comentado -, sua trama fazendo sentido ou não.

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26 agosto, 2013

Sem Dor, Sem Ganho (Pain & Gain, EUA, 2013).


Uma coisa é certa: não é com este Sem Dor, Sem Ganho que veremos alguma profundidade em uma obra do explosivo cineasta Michael Bay (Transformers). Dono de uma filmografia de sucesso comercial, apreciado por grande parte do público que procura "diversão", contudo execrado por grande parte da crítica (e do público um tantinho mais exigente), Bay "vendeu" este seu mais recente trabalho como um filme menor em sua carreira, uma espécie de trabalho despretensioso, em comparação aos grandes blockbusters de sua carreira. Certamente Sem Dor, Sem Ganho é um filme menos agitado em comparação à franquia Transformers, por exemplo, mas nem por isso deixa de manter a estética e os maneirismos próprios do diretor, uma espécie de assinatura em formação, já que estes elementos encontram-se presentes em quase todos os seus filmes, mas nem sempre são utilizados da maneira ideal, orgânica, integrada a narrativa.

Logo de cara é possível notar que Bay, ao lado de seu diretor de fotografia, Ben Seresin (Linha de Ação), foram inspirados pela estética adotada por Oliver Stone em filmes como Assassinos por Natureza e Selvagens, visto que o destaque as cores quentes, a explosão de luz solar e, de certa forma, a composição surreal e onírica das imagens remetem de imediato a estas obras. Tal escolha se encaixa ao absurdo que é a trama do filme - esta é inspirada em eventos reais, não mais que isso -, todavia, devido a mão pesada do diretor, acaba sendo explorada além do limite, passando a incomodar um bocado quando explorada em sua completude (contraluz, enquadramentos estourados) e aliado a câmera lenta ou cortes frenéticos. Na minha opinião, só existe um Tony Scott - a fotografia do filme Domino, de Scott, também pode ter sido tomada como referência - e este infelizmente nos deixou.

A bem verdade Sem Dor, Sem Ganho é um filme de comédia e, se não fosse a mão pesada de Bay, que insiste em atropelar o tom cômico (e muitas vezes surtado) do filme com sequências exageradíssimas (não estamos assistindo Transformers ou A Rocha, por exemplo) de ação e o corte exagerado do filme - a metragem total ultrapassa as duas horas, quando poderia ter o mesmo resultado com vinte ou trinta minutos a menos -, poderia até mesmo sagrar-se como uma boa surpresa, pois possivelmente galgaria a posição de melhor filme dirigido por Bay. Todavia, devido aos excessos (injustificáveis, ao meu ver), este posto continua com o primeiro Transformers.

Apesar de inspirado em uma história real - acontecida no início dos anos 1990 -, o roteiro da dupla Christopher Markus e Stephen McFeely (Capitão América: O Primeiro Vingador) exagera demais na caricatura, proporcionando assim um misto de frescor aliado a um sentimento de descrença quanto aos eventos que são desenvolvidos em tela, mesmo que o espectador esteja ciente de que esta se trata de uma obra cinematográfica de ficção. Sendo assim, se na composição do roteiro já escapam alguns exageros, quando este é realizado em forma de som e imagem por um sujeito como Michael Bay tais excessos galgam outro nível. 

O elenco do filme é um dos grandes atrativos, pois conta com nomes relevantes à filmografia norte-americana atual, como Mark Wahlberg (Ted), Dwayne Johnson (Com as Próprias Mãos), Anthony Mackie (Os Agentes do Destino), Tony Shalhoub (série Monk), Rob Corddry (A Ressaca) e Ed Harris (Caminho da Liberdade). Destes, destacaria as composições de Johnson (cada vez mais a vontade como comediante, o que não deixa de ser surpreendente), carismático a beça e de Shalhoub, que adota uma postura de interpretação no melhor estilo Joe Pesci (Os Bons Companheiros), recheada de palavras de baixo calão, pavio curto e gritaria. Wahlberg, apesar de ser o protagonista, acaba eclipsado pelos bons trabalhos de Johnson e Mackie (mas é de se admirar o quanto este "cresceu" para construir seu personagem), enquanto Harris surge apenas como o coadjuvante de luxo, sem grandes pretensões ou entrega. Quanto a Coddry, este repete o papel de "espertalhão" que vem marcando sua carreira.

Um dos maiores problemas que encontrei em Sem Dor, Sem Ganho está relacionado a inversão moral defendida por Bay e seus roteiristas, que vinculam o trio de protagonistas ao sonho americano da conquista através do esforço próprio, da própria dor e ganho, quando o que, em essência, este não passa de um conjunto de seres humanos abobalhados, alienados profundamente pelo sistema operante e que, se deixaram alguma lição, foi a de não fazer, pensar ou induzir nada do que eles realizaram/confabularam. Do início ao fim há uma glorificação destes indivíduos, inclusive no desfecho "feliz" pré créditos finais, quando nos é informado a pena recebida por qualquer um deles. Enfim, Michael Bay comprova aqui que seus valores são mais deturpados do que imaginava até então.

Com isso, apesar das boas intenções e do bom elenco - que, sem sombra de dúvidas, se entregou de forma pesada ao projeto -, o filme não diverte como deveria divertir, nem envolve como poderia envolver, sagrando-se como uma peça de entretenimento fugaz, porém vez ou outra divertida, mas longe de ser nivelada. Diria que vale a pena ser conferido e que, em comparação a outras obras assinadas por Bay, esta até que é bacana. Todavia, refletindo um pouco após sua exibição, confesso que certamente não revisitarei tal obra futuramente, bastante esta experiência uno (o que, ao meu ver, não é um bom sinal). O certo mesmo é que dá para rir com e de Sem Dor, Sem Ganho, mas o saldo de gargalhadas é pouco em comparação aos firulas dispostas em tela por cerca de 130 minutos.

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20 agosto, 2013

13 Assassinos (Jûsan-nin no shikaku, JAP, 2010).


Sem sombra de dúvidas o cineasta japonês Takashi Miike (Ôdishon) pode ser considerado um herdeiro direto do mestre Akira Kurosawa. Realizador desta excelente obra de ação com contornos "nipo-filosóficos" de honra e moral, Miike se sai bem tanto quando conduz a primeira metade do filme, focada no desenvolvimento da "conspiração" com fins ao assassinato de um nobre de grande influência à sociedade japonesa do século XIX (final do Japão feudal), mas que comete crimes bárbaros sem justificativa plausível que não a "maldade" e/ou a "loucura", quanto ao orquestrar sequências inspiradas de ação, com direito a combates de espada recheados de sangue - mas que em momento algum soam apelativos ou exageradamente gráficos -, que ganham em "realidade" por não se resumir apenas ao espetáculo e a pirotecnia, abraçando ao lado deste sangue o suor, destacando com propriedade que em qualquer batalha o esforço físico demandado é castigante. 13 Assassinos é um remake de um filme assinado por Eiichi Kudo nos anos 1960 - o qual não vi -, mas que se mostra acertado por optar por recontar esta história utilizando uma linguagem moderna, que dá frescor ao gênero, mas sem descaracterizá-lo.

Certamente o filme todo mostra-se interessante, contudo, seu segundo e terceiro atos, que abraçam quase que por inteiro o conflito entre os treze (na verdade doze) samurais incubidos do assassinato de Matsudaira Naritsugu - uma das motivações deste assassinato se deu devido a possibilidade daquele assumir o título de Xogum japonês - e a guarda do nobre, formada por aproximadamente duas centenas de soldados, são os grandes destaques da obra, tanto pelo ritmo e pela série de situações criadas por Miike, com fins a manter o espectador sempre atento ao embate, quanto também pela qualidade da atuação do elenco, especialmente no âmbito físico, pois como frisado anteriormente, são perceptíveis o esforço e o cansaço de todos os envolvidos na peleja.

O senso visual de Takashi Miike é notório e, somando este a predisposição do mesmo à violência, fica fácil de compreender por que alguns o chamam de Quentin Tarantino japonês. Fã confesso de cineastas como David Cronenberg e Paul Verhoeven, além de, obviamente, Kurosawa, Miiki não pode ser reduzido a uma versão nipônica de Tarantino pois, apesar de abraçar uma estética parecida com a do cineasta norte-americano - talvez devido as influências de ambos os cineastas serem similares -, há diferenças entre suas composições, tendo Miiki um caráter mais clássico que o de Tarantino, mesmo que isto não o impeça de aplicar uma narrativa mais moderna, na qual a montagem e a interação entre sequências mais contemplativas com aquelas de ação visceral encontram-se mais próximas. Apesar de possuir uma larga filmografia, Miike não é nenhum especialista em épicos de ação, todavia o que este mostra em 13 Assassinos parece contradizer isto, tamanho o cuidado e organicidade destilado pela obra.

Certamente existem pequenos problemas na construção do filme, especialmente devido ao excesso de informação nos primeiros dez minutos e a opção duvidosa pela criação de uma sequência excessivamente apoiada em efeitos visuais digitais (me refiro ao momento em que os samurais lançam uma dezena de animais contra os soldados de Naritsugu). Fora isso temos uma obra bem conduzida, cujo sendo de direção e empatia mostram-se fortes, tendo todo o poder para despertar a curiosidade e atenção do espectador durante toda a projeção. Uma coisa é certa, quem conseguir vencer a barreira dos primeiros minutos não desgrudará do assento até o último quadro da espetacular sequência de combate após a primeira hora de projeção.

Exemplar de entretenimento de primeiro nível - como faz falta que mais títulos assim cheguem ao Brasil, pois nem só de produção hollywoodiana vive o mundo do cinema pop -, dono de umas das sequências de ação mais espetaculares dos últimos anos, de uma fotografia ora deslumbrante, ora incômoda (a cargo de Nobuyasu Kita) e que conta com um elenco de primeira categoria - destacaria as performances de Kôji Yakusho (talvez mais conhecido por sua participação no filme Babel, de Alejandro González Iñárritu -, que interpreta o líder da trupe de samurais, Shimada Shinzaemon, Gorô Inagaki, que compõe muito bem o antagonista da história, Naritsugu e Yusuke Iseya, que cumpre bem a função de promover alívio cômico ao filme, através de seu personagem, o caçador montanhês Kiga Koyata (o 13º assassino).

13 Assassinos pode ser apontado como um dos melhores épicos de ação da década, muito devido ao senso estético-narrativo do visceral Takashi Miike, que consegue unir com precisão e coerência o requinte artístico de Akira Kurosawa ao grafismo e predisposição à violência da geração Playstation 3. Confesso não conhecer a filmografia de Miike (a única referência que possuo do cineasta é o episódio da série Masters of Horror dirigido pelo mesmo), mas após esta espetacular experiência cinematográfica passarei a acompanhar com mas afinco seus trabalhos, pré e pós este 13 Assassinos.

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19 agosto, 2013

Somos Tão Jovens (BRA, 2013).


A expectativa era grande quanto a visualização deste filme, tanto que dificilmente tal desejo seria concretizado de forma absoluta, pois Somos Tão Jovens é, propositalmente ou não, uma cinebiografia do ícone Renato Russo e, por conseguinte, do nascimento da cena rock na capital do Brasil, a deslocada Brasília.. De certa forma, tal constatação tira parte do possível impacto negativo apresentado pela obra, mas isso não quer dizer que a avaliação tenha que ser menos criteriosa, até por que, apesar da importância do homenageado em tela, este é um filme como qualquer outro e, antes de mais nada, deve ser visto, sentido, compreendido e analisado como tal.

Sucesso inconteste de bilheteria, Somos Tão Jovens amargou críticas medianas, que, de certa forma, refletem o filme no contexto geral: um bom filme, porém sem grandes atrativos. Há um bom trabalho de elenco no filme, mérito este do diretor Antônio Carlos da Fontoura (Gatão de Meia Idade), contudo, nem todos possuem personagens bem desenvolvidos, inclusive alguns não passam de caricaturas, pois encontram-se totalmente apoiados nas imagens que nós, público, possuímos de alguns artistas da cena brasiliense à época (anos 1970-1980), como os irmãos Fê e Flávio Lemos e Dinho Ouro Preto (todos do Capital Inicial) e Herbert Vianna (líde d'Os Paralamas do Sucesso), talvez o mais prejudicado. É perceptível o esforço destes atores, no entanto, sem conteúdo seus personagens tornam-se apenas simulacros dos indivíduos verdadeiros, apresentados como uma embalagem cheia de maneirismos, mas sem motivação ou envolvimento algum.

Contudo, nem todo o elenco sofre com a falta de substância dada as personagens por Fontoura e Marcos Bernstein (roteirista), pois a dupla formada por Thiago Mendonça (2 Filhos de Francisco) e Laila Zaid (Heleno) compõem de forma sublime seus papeis, dando vida a Renato Russo e Ana Cláudia (uma das melhores amigas - e paixões - da vida de Russo), respectivamente. Enquanto esta se apoia no carisma, o segundo entrega um Renato Russo quase que perfeito, adotando tanto inflexões gestuais quanto verbais e até mesmo emulando com sucesso o tom grave e melancólico de Russo ao cantar, mergulhando bastante a fundo na maneira do eterno líder da Legião Urbana se portar, no limite entre a homenagem e a piada, compondo assim um dos melhores papeis da história das cinebiografias nacionais dos últimos anos - no meu ponto de vista, o trabalho de Mendonça está nivelado ao de Daniel de Oliveira, no filme (mediano também) Cazuza - O Tempo Não Pára. Certamente acompanhar a desenvoltura de Mendonça como Renato Russo é o maior atrativo do filme. Outro ponto que incomoda no roteiro de Bernstein é a excessiva inclusão de trechos ou referências as letras de Renato Russo nas falas das personagens, dando assim um caráter artificial e forçado aos diálogos, já que dificilmente Russo saia disparando chavões ou frases de efeito para em seguida aproveitá-las como canções.

É certo que, apesar da boa intenção, há problemas na narrativa do filme, especialmente na construção do roteiro - que aposta em demasia na coincidência dos eventos, no afastamento político-ideológico de Renato Russo perante os demais jovens de Brasília (à exceção de Ana Cláudia, que pode ser vista como uma espécie de bichinho de estimação de Russo, já que acata qualquer filosofia, ideia ou manifestação cultural capitaneada por ele) e no estilo de direção abraçado por Antônio Carlos da Fontoura, que vez ou outra investe em uma linguagem visual muito próxima a da televisão, tornando a narrativa cansada, pouco estimulante e, de certa forma, superficial. Há um excesso de didatismo na direção e no roteiro do longa que certamente descaracteriza a própria essência contestadora e liberalmente artística de Renato Russo, situação esta que torna o filme mais palatável e "redondinho", contudo também mais genérico e pouco inventivo.

Podendo ser classificado como um entretenimento interessante, que presta homenagem tanto ao grande Renato Russo quanto à importância do cenário punk/rock de Brasília em meados dos anos 1980, Somos Tão Jovens pode ser definido como um rascunho de uma boa obra, pois apesar de funcionar como obra-tributo reverente a uma época inesquecível à história brasileira, sua indecisão em abraçar a cena rock da época como protagonista ou simplesmente a persona de Renato Russo acabam tornando a ambição do filme bem maior que o resultado final. Some-se isso a linguagem um tanto "Malhação" do longa, e temos aí um filme com mais cara de especial de fim de ano da Rede Globo (que, por sinal, é uma das produtoras da obra) do que de cinema, mal este comum dentre 7 de 10 produções nacionais (especialmente àquelas com o selo Globo Filmes). Somos Tão Jovens é um filme simpático que poderia ser bem melhor, já que tinha material para isso e deixa um gostinho amargo em seu final, mas ainda assim vale a pena assisti-lo.

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14 agosto, 2013

Planeta dos Macacos (Planet of the Apes, EUA, 2001).



Não é a primeira vez que revejo a visão de Tim Burton (Sombras da Noite) para o livro de Pierre Boulle e para o filme Planeta dos Macacos, de 1968. Contudo, somente durante esta última conferida é que um certo lampejo me veio a mente: o cinema de Burton parece mais fascinante, coerente e interessante apenas quando ainda somos crianças! Obviamente que tal assertiva soa muito genérica, pois há filmes (bons) do diretor cuja configuração pode ser compreendida como "adulta", a exemplo de Ed Wood e Peixe Grande, por exemplo, filmes estes cujo sub-texto e nuances são (possivelmente) imperceptíveis aos olhos de uma criança, mas agradabilíssimos aos de um adulto. Dito isto, voltemos ao remake de Burton para o clássico da ficção-científica Planeta dos Macacos

Apesar desta versão de Planeta dos Macacos ter alguns lampejos de seriedade, a falta de uniformidade e o excesso de referências ao ambiente humano na caracterização de uma sociedade oposta a nossa (é difícil acreditar que, apesar das óbvias referências, uma sociedade composta apenas por símios repita as manifestações culturais da raça humana, sem nenhuma qualidade que as distinguam) acabam por incomodar a imersão nesta parábola futurista, que ainda por cima reduz a discussão do filme original e do livro no qual se baseia a uma simples aventura estilo "peixe fora d'água" e muita correria. A falta de carisma de Mark Wahlberg (Rock Star) também compromete esta imersão, tendo em vista que o ator parece mais impressionado como o fato de estar imerso em planeta habitado por símios inteligentes, do que seu próprio personagem. Falta profundidade a composição do ator, que ao meu ver não é ruim, pois quando disposto entrega boas interpretações, seja em filmes de conotação mais dramática ou mesmo em passatempos de ação. Infelizmente Wahlberg não convence como astronauta de expedição, tendo um desempenho parecido com o que viria a repetir no filme Fim dos Tempos, de M. Night Shyamalan, totalmente desconectado ao filme no qual participa.

Começando em desvantagem pela pouca força de convencimento apresentada pelo seu protagonista - e, de certa forma, o "único" rosto humano de referência à trama do filme -, o Planeta dos Macacos de Tim Burton, apesar de não possuir a estética característica do cineasta - pelo menos não de forma explícita -, traz no quesito visual seu grande trunfo, seja através do ótimo serviço de maquiagem a cargo do mestre Rick Baker (Homens de Preto), do desenho de produção -  a cargo de Rick Heinrichs, de Capitão América: O Primeiro Vingador - e até mesmo dos efeitos visuais, que mesmo passados 12 anos, ainda cumprem bem o seu papel. Sendo assim, apesar do visual não remeter de imediato aos trabalhos anteriores de Burton, este não deixa de ser o grande atrativo do filme, visto que o roteiro do longa oscila em termos de qualidade, acertando um pouco como entretenimento, mas deixando o discurso social um tanto de lado.

Coube ao trio formado por William Broyles Jr. (A Conquista da Honra), Lawrence Konner (Aprendiz de Feiticeiro) e Mark Rosenthal (Poderoso Joe) adaptar a obra original de Pierre Boulle ao novo milênio, porém, do ponto de vista temático, pouca coisa foi respeitada. É certo que também há uma abordagem distinta do filme de 1968 em comparação ao romance de Boulle, contudo, naquele filme, existe uma busca por manter a essência do discurso apresentado pelo escritor francês, seja através do poder simbólico contido em algumas falas das personagens, seja pelo choque imagético e textual causado pela cena final daquele filme. Ou seja, se o longa dos anos 1960 apresentou uma adaptação viável àquela época específica, tendo uma cara própria, mas mantendo a essência do livro, esta versão assinada por Tim Burton opta por reduzir o contexto político-social da obra livro e da primeira versão de cinema em uma aventura com toques de ação, sem buscar aprofundar temas caros àquelas versões, como evolução, cultura e belicismo. O conceito deste Planeta dos Macacos é tão mastigado que a civilização símia apresentada praticamente não possui elementos culturais distintos da humanidade - aspecto este distinto das versões citadas, pois apesar da aproximação, residiam ainda peculiaridades específicas tanto da cultura humana, quanto da símia -, sendo esta apresentada à exaustão e de forma gratuita, como os grupo de jovens símios "roqueiros", por exemplo.

Há também sérios problemas estruturais no roteiro desenvolvido por Broyles Jr., Konner e Rosenthal, especialmente quanto estes tentam inserir tons de comicidade à trama, enquanto o visual do filme, escuro e hostil, desperta um sentimento de desconfiança, quiçá temor. A (boa) trilha sonora assinada por Danny Elfman (Hitchcock), ao lado das maquiagens e composições dos atores Tim Roth (A Negociação) e Cary-Hiroyuki Tagawa (Mortal Kombat), reforçam este viés mais denso, enquanto gente como Paul Giamatti (A Dama na Água) aposta no lado cômico. Nomes como Helena Bonham Carter (Os Miseráveis) e Michael Clarke Duncan (À Espera de um Milagre) estão no meio termo, enquanto Kris Kristiferson (Blade - O Caçador de Vampiros) surge completamente deslocado. Por fim, temos a presença da inexpressiva Estela Warren (Alta Velocidade) como interesse romântico do personagem de Mark Wahlberg. Este choque de visões quanto ao que o produto se propõe prejudica a coerência narrativa da obra, tornando-a incoerente, podendo isto ser constatado até mesmo pelos cinéfilos menos criteriosos.

Longe de ser um desastre, mas também distante de ser considerado um bom filme, Planeta dos Macacos de Tim Burton é um filme esteticamente bonito, mas que pouco tem a dizer, que dirá preencher as lacunas do filme de 1968. Com um pouco de esforço e boa vontade esta obra pode ser apreciada como uma peça entretenimento efêmero, porém vez ou outra tal jornada pode se tornar cansativa, já que a premissa de um estranho no ninho apontada pelo longa é pouco desenvolvida, já que o visitante de outro mundo tem uma adaptação praticamente automática a uma sociedade alienígena cuja existência conflita diretamente com os paradigmas existenciais do primeiro. Muito se fala sobre o final apoteótico deste filme, todavia, este não passa de uma adaptação relativamente fiel do apresentado no livro de Boulle. O problema é que o restante do filme não assume essa "pegada", tornando o conceito deste desfecho vazio. Há bons e maus momentos neste filme, inclusive elementos embebidos da obra de Boulle que foram limados na versão de 1968, mas a opção de limar boa parte das discussões e focar basicamente na correria, no perseguição ao estilo gato e rato, enfraquece o filme como um todo, tornando-o assim não mais do que mediano, como ilustram bem as estrelas abaixo.

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09 agosto, 2013

Tese Sobre um Homicídio (Tesis Sobre un Homicidio, ARG, 2013).


Um dos maiores sucessos de bilheteria do cinema argentino (foram contabilizados mais de 1 milhão de espectadores que assistiram ao filme), Teses Sobre um Homicídio é um thriller psicológico eficiente, cuja temática envolve tanto o universo jurídico do país - grande parte do filme é ambientada nas dependências de uma faculdade de Direito, além do protagonista ser um advogado e professor de grande reconhecimento - quanto o crime, este, obviamente, conectado a abstrações e teorias acerca do universo do direito penal. Adaptado por Patricio Vega (Meu Primeiro Casamento) do livro homônimo de Diego Paszkowski, a formatação do filme lembra bastante as produções norte-americanas, especialmente na forma de dirigir de Hernán Goldfrid (Música en Espera).

Seguramente alardeado por se tratar da mais recente obra estrelada pelo ótimo Ricardo Darín (O Segredo dos seus Olhos), Tese Sobre um Homicídio possui qualidades suficientes para transcender o nome do ator, pois funciona tanto como filme de gênero - para mim, uma das particularidades que o atual cinema argentino possui e que o cinema brasileiro poderia tomar como exemplo - quanto como "cinema autoral", resultando assim em um casamento bem azeitado entre os dois "estilos". Com isso, não quero dizer que este é um filme impecável, mas é competente como entretenimento e  levanta alguns questionamentos importantes. Ademais, apesar de se fazer interessante por si só, o filme só ganha uma nova camada devido à participação de Darín, que mesmo limitado a um arquétipo pré-definido, agrega bastante dramaticidade ao seu personagem e, respectivamente, ao filme. 

Estilisticamente o filme de Goldfrid me lembra um casamento entre Brian De Palma (Vestida para Matar) e David Fincher (Se7en, os Sete Crimes Capitais), tendo uma fotografia que remete à obras deste, enquanto alguns enquadramentos e inclusive toda uma sequência - a que envolve uma "perseguição" em uma galeria de arte - são puro De Palma. O diretor de fotografia Rolo Pulpeiro (Um Conto Chinês) reproduz com propriedade a visão-homenagem de Goldfried, agregando também seu próprio estilo, contribuindo assim para que tais elementos não surjam desconexos à ambientação do filme ou até mesmo como caricaturas do cinema de Fincher e De Palma. Outro ponto relevante a se destacar é a música incidental composta por Sergio Moure (El Cuerpo), que opta por uma orquestração minimalista, recheada de notas dissonantes, que se encaixa muito bem à proposta de confusão sugerida pelo filme, sendo assim competente em sua missão de mediar o clima da obra. 

Um ponto relativamente fraco do filme se encontra na escalação do elenco principal. À exceção de Darín, tanto Alberto Ammann (Lope) quanto Calu Rivero não convencem por completo em seus respectivos papéis, sendo o primeiro "maduro" demais para o papel de estudante (mesmo que seja de um curso de especialização), enquanto a segunda, apesar da beleza, não convence dramaticamente. Há uma cena bastante importante para a progressão narrativa do filme, onde ocorre um embate entre as personagens de Rivero e Darín, porém a atriz não convence, soando falso sua expressão de medo e desespero. Certamente pesou o fato deste ter sido o primeiro trabalho da atriz na mídia cinema (esta vinha realizando trabalhos na tevê), pois seu problema é distinto do de Ammann, ator já bastante requisitado, mas que infelizmente não encaixou bem ao papel, mesmo que este seja reconhecidamente talentoso.

Apesar de possuir um andamento relativamente lento, mas que gera interesse principalmente pela presença quase que onipresente de Ricardo Darín - é fantástico observar a decadência física e psicológica que o ator emprega ao seu personagem no decorrer do filme -, Tese Sobre um Homicídio sagra-se como um bom filme, cujos problemas não interferem de forma drástica na ideia central da obra. De caça ao assassino o filme passa a tratar das consequências da fixação, da paranoia e, de certa forma, da esquizofrenia, dispondo em tela mensagens visuais que ecoam a dúvida: trata o filme da realidade concreta visualizada pelo personagem de Darín e somente por ele (uma espécie de despertar não seguido por aqueles que estão ao seu entorno) ou qualifica este como um homem perdido em suas abstrações, tão aficionado por uma tese, cuja concretude parece existir apenas para ele. 

A ênfase do filme ao destacar as garrafas de Whisky vazias na casa de Roberto (Darín) e os seguidos copos da mesma bebida entornados cena a cena pelo personagem dão margem a duvidar-se quanto à veracidade dos fatos levantados pelo mesmo, dando ao filme um caráter propositalmente dúbio, que só vem a se confirmar em seu desfecho óbvio para alguns e incômodo para outros, o que por si só já vale a conferida. Tese Sobre um Homicídio não opta pela originalidade, mas convence mesmo ao apostar em uma possível mesmice e, se nada disso te convencer a assistir ao filme, concluo com apenas duas palavras: Ricardo Darín.

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05 agosto, 2013

Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças (Eternal Sunshine of the Spotless Mind, EUA, 2004).

"Você pode apagar alguém da sua mente. Tirá-la do seu coração é outra história"    (Livre tradução da frase disposta no poster promocional do filme).
Uma obra pode tratar de um tema conhecido, até mesmo comum, mas nem por isso deixará de trazer novidade, de reciclar o tema através de uma linguagem distinta, da utilização de um elemento outro que conduza o conhecido por um viés desconhecido, proporcionando assim uma viagem de rotina cujo caráter principal seja rico de frescor. E, para tratar de um tema tão universal como o amor, por que não trazer como condutor desta jornada um nome tão desconectado ao gênero romance como o de Jim Carrey (Número 23)? Por que não adicionar pequenos elementos de ficção-científica (máquina que "deleta" memórias das pessoas) em torno de uma trama de amor? Por que não inverter a lógica da montagem, brincando com figuras de linguagem, em especial a metáfora, transformando assim a obviedade numa poesia estético-filosófica, cuja complexidade reside na simplicidade de sua premissa: homem deprimido decide apagar as memórias de seu relacionamento com ex-namorada pois descobre que esta também o apagara de sua vida. É partir deste broto que o fruto do filme se desenvolve, acoplando aí diversos outros elementos que, relacionados ou não de forma direta ao relacionamento do ex-casal, constroem a ambientação deste filme simbólico e corajoso, que discute acerca do relacionamento entre um homem e uma mulher de maneira emblemática.

Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças, filme dirigido pelo francês Michel Gondry (Rebobine, Por Favor) e escrito por Charlie Kaufman (Adaptação), Pierre Bismuth e pelo próprio Gondry, é muito bem sucedido ao apelar para o estranhamento, ao retirar o espectador do lugar comum quando inverte - literalmente - a ordem dos eventos que preenchem um relacionamento, brincando a todo momento com as vidas das personagens que circulam pelo universo do filme, costurando assim uma história deveras improvável, mas cujo cerne é tão interessante que o óbvio apelo fantástico da obra fica em segundo plano, pois cada frame do filme passa a ser mais do que acreditável, pois adquire o status de realidade (mesmo que realidade cinematográfica). O filme também guarda elementos de cunho terapêutico, já que tem como um de seus objetos de estudo a dinâmica do relacionamento, com seus arranjos e desarranjos, seus acordos e desacordos, seus encontros e desencontros, enfim, a imprevisibilidade dos sentimentos como condutores de qualquer relacionamento é alvo do filme, somado a complexidade de se administrar um relacionamento.

O casting do filme é um dos grandes atrativos, pois além dos excelentes Jim Carrey e Kate Winslet (Titanic) - que formam o casal Joel e Clementine e compõem aqui personagens riquíssimos e interessantes, grandes responsáveis pela materialização do roteiro - temos as presenças de Tom Wilkinson (O Cavaleiro Solitário), Kirsten Dunst (Na Estrada), Mark Ruffalo (Os Vingadores) e Elijah Wood (trilogia O Senhor dos Anéis) em papeis secundários, mas de grande importância à trama. Não só seus personagens são bons, como também os intérpretes, sendo este elenco, ao lado do roteiro "pirado", o maior atrativo do filme. Contudo, dentre estes Carrey e Winslet sobressaem. Esta, camaleônica como sempre, desenvolve uma persona distinta de qualquer papel já abraçado pela mesma, dando vida e unidade a uma personagem completamente deslocada (no sentido de perdida, sem rumo), mas nunca desinteressante. Quanto a Carrey, apesar deste já ter apresentado seu viés dramático em títulos como O Show de Truman, constrói aqui talvez seu personagem mais complexo, pois praticamente não se agarra as muletas da comicidade, dando tamanha dimensão e profundidade a seu personagem que é fácil se perguntar se é realmente Jim Carrey que estamos vendo em tela.

Saindo um pouco do lado criativo, é necessário parabenizar o trabalho de direção de Michel Gondry, que utiliza com requinte a iluminação, os enquadramentos de câmera e a montagem, trabalhando-os como elementos que servem a narrativa, mas que não deixam de, vez ou outra, chamarem a atenção para si, especialmente nos momentos, digamos assim, mais surtados do longa. Há em Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças a inserção de muitos elementos oníricos e certa confusão - proposital - entre sonho e realidade e é a partir destes elementos que Gondry, ao lado de sua diretora de fotografia (Ellen Kuras, de Profissão de Risco), vai costurando o quebra-cabeças que é o filme, até por que muito dele é baseado nos fragmentos das lembranças divididas pelos personagens Joel e Clementine.  Gondry vai construindo a estética do filme no limite entre a discrição e o exagero, dando a este uma cara toda especial.

Cultuado tanto pelos entusiastas da sétima arte quanto pelos  apreciadores de filmes de amor ou até mesmo de admiradores de manifestações artísticas com um quê moderno, Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças é ao mesmo tempo um tocante drama de amor, cujo aparato estético reforça o conceito da obra como um todo, como também pode ser visto como um exercício estético cujo conteúdo recheado de metáforas admite significados e significantes distintos a cada espectador, dependendo assim da percepção particular de cada um. Seja o filme interpretado de uma forma ou de outra, certo mesmo é que esta experiência audiovisual metafórica construída por Gondry, Kaufman, Bismuth e, indiscutivelmente, por Carrey e Winslet, é uma obra artística distinta e única, que se apropria de temas absolutamente corriqueiros e universais e os transpõem sob um contexto distinto, procurando provocar sensações e obrigando aqueles que a assistem que abstraiam até o último frame projetado. Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças é, mais do que tudo, uma viagem audiovisual única.

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04 agosto, 2013

Tempo de Matar (A Time to Kill, EUA, 1996).

"Um advogado e sua assistente lutando para salvar um pai de um julgamento de homicídio. Um momento de questionamento sobre o que eles acreditam. Um momento de dúvida quanto ao que eles confiam. Sem tempo algum para cometer erros" (Livre tradução do texto disposto no poster promocional do filme).
Talvez a melhor adaptação cinematográfica de obras do best-seller John Grisham (A Firma, O Cliente), Tempo de Matar une com propriedade uma história envolvente e política, um elenco afiado, bom senso de ritmo e uma direção inspirada, a cargo do desafeto de muitos - mesmo sendo dono de uma filmografia exemplar, pelo menos até meados dos anos 2000 -, Joel Schumacher (Número 23). Tocando fundo a ferida da segregação social no sul dos Estados Unidos - no caso do filme, o quase sempre malfadado estado do Mississípi - através da metáfora do julgamento (jurisdicional, social, moral, político), a adaptação do roteirista Akiva Goldsman (Uma Mente Brilhante) é eficiente, pecando apenas na caracterização de alguns personagens (a exemplo daquele interpretado por Oliver Platt), exagerando na estereotipização. 

É interessante que o filme ainda mantém o vício hollywoodiano de "hierarquização de celebridades" na disposição dos créditos iniciais, pois, apesar deste ser protagonizado pelo até então desconhecido Matthew McConaughey (Killer Joe - Matador de Aluguel), seu nome é precedido pelo de dois outros astros bastante em voga à época, mas cujos papeis, apesar de importantes, não podem ser considerados como de protagonistas. São estes os de Sandra Bullock (Crash - No Limite) e de Samuel L. Jackson (Django Livre). Obviamente tal escolha não influencia na qualidade do filme, mas não deixa de ser um aspecto incômodo, no sentido de como é distinto o pensamento artístico do marketing hollywoodiano.

Contando com pequenas (e ótimas participações) de nomes como Donald Sutherland (Jogos Vorazes),  Ashley Judd (Possuídos), Patrick McGoohan (Coração Valente), Brena Fricker (Meu Pé Esquerdo) e Kiefer Sutherland (Cidade das Sombras) - ratificando o destaque que as atuações tem neste filme - ao lado dos desempenhos inspirados (e inspiradores, por que não) de McConaughey e L. Jackson (este, inclusive, recebedor de uma indicação ao Globo de Ouro pelo papel), Tempo de Matar sobressai as convenções do gênero, especialmente quando toca a ferida - cujo escopo é mais do que conhecido - do preconceito racial e dos limites éticos e morais que envolvem uma justiça praticada por brancos em território de ampla população negra. Para não dizer que o filme, no que se refere a escalação de elenco, é impecável, afirmo que não gostei da performance de Kevin Spacey (Se7en, os Sete Crimes Capitais) como o promotor de justiça e, consequentemente, vilão assumido da obra. Apesar de reconhecer o talento do ator (e gostar do mesmo), sua composição excessivamente clichê - agente da justiça irônico, impotente e dotado de excesso de confiança - destoa um pouco do restante do filme, além de ajudar a prever a grande derrota (judicial e, principalmente, moral) do mesmo no desfecho.

Há quem considere o encerramento do filme excessivamente "bonzinho", opinião com a qual não concordo, pois a sensação de recompensa dada pelo mesmo serve apenas como paradoxo a todo o debate ético e étnico desenvolvido até então. Todavia, concordando ou não com este desfecho, creio ser impossível não ser tocado pelo discurso poderoso entoado pelo personagem de Matthew McConaughey, que coroa não apenas o grande trabalho do ator, como também sintetiza todo o contexto abraçado pelo filme.

Dirigido com pulso forte e de forma contundente por Schumacher, Tempo de Matar é daqueles filmes cujo argumento esperto - inclusive uma das forças motriz deste reside no poder da argumentação - e o peso de suas atuações - Spacey a parte - o transformam em um produto acima da média, já que dramas jurídicos temos aos montes, só que estes raramente conseguem tocar sem que se tornem menos inteligentes ou acabem por deixar a coerência de lado e o longa de Schumacher, felizmente, não se encontra nesse grupo, pois encontra-se numa prestigiada posição de equilíbrio, sendo acima de tudo um grande filme, independentemente de ser caracterizado de jurídico ou não jurídico. 

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O Cavaleiro Solitário (The Lone Ranger, EUA, 2013).


O poster do filme disposto acima é autoexplicativo: representa de forma objetiva e ao mesmo tempo metafórica o carnaval de gêneros e a falta de direcionamento desta nova incursão dos parceiros de negócios Gore Verbinski (diretor e produtor), Jerry Bruckheimer (produtor) e Johnny Depp (ator e produtor executivo). Defendido como um faroeste moderno pelos realizadores, mas confirmado pela crítica especializada como um Piratas do Caribe no velho oeste, dentre este dois conceitos acabo por me inclinar mais à corrente dos críticos, já que, mesmo que o filme apresente certo tom de modernidade, a balbúrdia espelhada pela falta de direcionamento quanto ao estilo/gênero do mesmo e a busca incessante pela autorreferência - neste caso, à franquia do bucaneiro Jack Sparrow, cuja associação é imediata e por osmose - acabam por sabotar toda a boa vontade investida no projeto, que somado a sua grandiloquência culminou numa péssima avaliação da crítica e numa arrecadação risível nas bilheterias mundo afora, sequer conseguindo (até então) empatar seu alto (põe alto nisso) custo de produção. O Cavaleiro Solitário, quer queria quer não, realmente morreu sozinho.

Os trailers já adiantavam que a grandiloquência seria o fio condutor do filme, mas até então não era sabido que sua duração e os estilos cinematográficos abraçados também seguiriam a mesma filosofia. Resultado? Uma obra cujo visual realmente impressiona, mas cujo roteiro, sequências de ação e falta de definição em sua proposta artística - trata-se de uma aventura, de um longa de ação, de um faroeste dramático ou de uma comédia de costumes? Tudo isso e nada disso - arruína o impacto das cenas cuja fotografia (Bojan Bazelli, de Rock of Ages) homenageia grandes nomes como Sergio Leone e John Ford. É verdade que nem toda sacada dos envolvidos é de todo mal, mas a mania de aumentar tudo ao máximo da capacidade cognitiva humana e duplicá-la em seguinte, já havia dado sinais de cansaço na franquia Piratas do Caribe e, nesta espécie de spin-off não oficial da mesma, a coisa desanda de vez.

Além dos nomes citados acima, pelo menos mais três personagens remontam a franquia pirata. O roteiro desta parafernália foi arquitetado - palavra forte - a seis mãos, sendo Terry Rossio e Ted Elliott os "criadores" da série Piratas do Caribe. O texto foi complementado por Justin Haythe (Foi Apenas um Sonho), talvez o responsável por tentar por um pouco de bom senso nos disparates elaborados por Elliott e Rossio. Contudo, a coisa não dá lá muito certo, pois a construção atabalhoada do longa o torna enfadonho - muito longo e redundante -, anestesiante - chega um momento que tamanho barulho, explosões e cenas de ação cujo nível de absurdo não podem ser medidos passam a ser absorvidos sem nenhuma reação por parte do espectador, tamanha a força opressora - e um tanto broxante, pois apesar do grande espetáculo oferecido, é mais do que óbvia a fragilidade conceitual e narrativa do filme. A fórmula aplicada pelos roteiristas já havia demonstrado certo cansaço ainda na série Piratas do Caribe, mas é aqui que esta atinge seu pior nível de criatividade. 

Mesmo intitulada de O Cavaleiro Solitário, a obra parte por um (óbvio) caminho distinto, relegando o personagem título - interpretado com certo esforço por Armie Hammer, de J. Edgar - ao posto de coadjuvante, enquanto o suposto coadjuvante passa a ser protagonista, simplesmente pelo fato deste ser interpretado pelo queridinho (e talentoso, sem sombra de dúvidas) Johnny Depp (Sombras da Noite). Depp, apesar de mais uma vez convencer pelo carisma e pelo jeito divertido de conduzir sua mais nova criação, o índio Tonto, não consegue estabelecer um diferencial válido entre este e seus últimos papéis, emulando aqui mais uma vez a personagem deslocada, um tanto louca e de andar particular, a exemplo do seu chapeleiro maluco em Alice, Frank Tupelo, em O Turista e, obviamente, sua mais conhecida criação, Jack Sparrow. É impossível dissociar o perfil de seu personagem Tonto do modus operandi da maioria de seus personagens da última década, pois nem mesmo os quilos de maquiagem (incluindo uma prótese no nariz e um corvo como chapéu) o salvam da constante repetição. É óbvio que o ator é talentoso e, vez ou outra, apresenta um sopro de criatividade e consegue roubar um sorriso do espectador, mas o comodismo é perceptível e, assim como todo o restante do filme, os exageros e a ambição acabam por levar tudo a perder ou pelo menos a tirar parte considerável do brilho pretendido pelos seus realizadores.

O elenco de apoio, apesar de também cair no lugar comum, traz uma boa contribuição ao filme, especialmente William Fichtner (Batman, o Cavaleiro das Trevas), cujo personagem é o grande vilão do longa e o cada vez mais presente em produções hollywoodianas James Badge Dale (Homem de Ferro 3), que vive o irmão mais velho do pouco desenvolvido Cavaleiro Solitário. No entanto, acompanhar mais uma vez a outrora aplaudida Helene Bonham Carter (Os Miseráveis) compor o tipo histérico-extravagante não dá, tendo esta inclusive superado Depp no quesito "autorrepetição" (perdão pela redundância, mas esta foi proposital). Completam o elenco coadjuvante o veterano Tom Wilkinson (O Exótico Hotel Marigold), que não compromete e o geralmente expressivo Barry Pepper (Inimigo do Estado), aqui bastante deslocado. No fim das contas o elenco pouco pode fazer tendo em vista o pouco interesse despertado por seus personagens devido ao roteiro capenga.

Gore Verbinski (Piratas do Caribe: A Maldição do Perola Negrateve como trabalho anterior a excelente animação Rango, cuja temática e abordagem encontra-se totalmente inserida no universo do faroeste. Sendo assim, é deveras estranho perceber que, à exceção da fotografia, do figurino e de algumas frases de efeito, pouco do dito bang-bang é abraçado pelo cineasta. A estrutura narrativa se comporta como uma espécie de casamento entre a ambientação estilizada de Piratas do Caribe e uma tentativa de empregar um caráter crítica à trama, que nunca se mostra suficiente, principalmente pela abordagem sem foco fixo do roteiro e da direção hiperbólica de Verbinski. Se em Rango tínhamos uma obra de arte sob o entorno de uma aventura, aqui temos uma aventura sem substância ou conteúdo relevantes.

Por fim, mesmo que a pirotecnia e a busca pela constante superação do clima de aventura através de sequências e mais sequências de ação ininterrupta se tornem o foco do filme, há alguns bons elementos que não estão atrelados à fotografia, como a inspirada abertura - o tom fabular impresso por Verbinski na cena inicial é interessante, pena que com o seu desenvolvimento esta vá perdendo o seu encanto - e algumas boas piadas. No mais, apesar de soar divertido em alguns momentos, O Cavaleiro Solitário é um filme deslocado, longo em demasia e pouco convincente, que não sabe a quem agradar nem como se conduzir. Se analisarmos os nomes envolvidos com a produção é fácil constatar que o resultado final do filme é muito pouco para tantos "talentos", o que, de uma forma ou de outra, acabou por ser refletido através das péssimas avaliações recebidas por ele, como também a arrecadação pífia ao redor do mundo, tendo o filme custado aproximadamente 215 milhões de dólares (fora os gastos promocionais) e arrecadado (até então) apenas 165 milhões. Muito pouco para tamanha pretensão, mas não posso dizer que não é merecido.

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