31 maio, 2013

Hitchcock (EUA, 2012).


Com um elenco afiado e uma direção até certo ponto segura, Hitchcock, ao contrário do que uma interpretação objetiva do título poderia sugerir, não é uma cinebiografia ampla do notório cineasta inglês (aqui vivido por Anthony Hopkins, de O Silêncio dos Inocentes), mas sim um pequeno recorte da relação do mesmo com sua esposa Alma (Helen Mirren, de Red - Aposentados e Perigosos) durante a feitura de um dos maiores clássicos do cinema, o fenômeno Psicose. Formatado como uma peça de humor, com o tom dramático surgindo de maneira pontual, o filme de Sacha Gervasi (Anvil: The Story of Envil) diverte, especialmente pelo comprometimento do elenco e das inúmeras referências à filmografia do "mestre do suspense".

Os momentos em que nos são apresentadas as rotinas dos envolvidos na produção do filme, desde a pré-produção (bastante conturbada) até a filmagem propriamente dita (que também passou por momentos de tensão) talvez sejam o grande destaque da obra, até por que é nelas que podemos acompanhar a rotina de nomes como Janet Leigh (Scarlett Johanson, de Os Vingadores), Anthony Perkins (James D'Arcy, de A Viagem) e Vera Miles (Jessica Biel, de O Vingador do Futuro), estrelas de cinema que fizeram parte do clássico Psicose. A interação entre estes e Hitchcock dão um corpo especial ao filme, que não passa de um "resumo" dos momentos de tensão e correria vividos pelo cineasta que encontrava-se a procura de um filme que deixa-se a todos (espectadores, estúdios, produtores, críticos etc.) atônitos. 

Apesar dos vários rostos que circundam a produção, o foco do enredo encontra-se na relação complexa e ímpar entre Hitchcock e sua esposa Alma - que inclui supostos affairs e desencontros amorosos -, que é competentemente traduzida nas interpretações de Hopkins e Mirren, tendo esta, ao meu ver, os momentos de maior entrega e, consequentemente, destaque do filme. Apesar de não comprometer em termos de disposição - é certo que houve um grande esforço por parte do ator no que se refere a capturar os trejeitos e maneirismos do cineasta -, ao meu ver a maquiagem da dupla Peter Montagna e Greg Niccotero (série The Walking Dead) acaba por engessar um pouco a interpretação de Hopkins, além de estabelecer uma figura híbrida entre o ator e Hitchcock, ou seja, nem um, nem outro. No fim, o estranhamento da maquiagem supera o deslumbre quanto a transformação do ator, sentimento este semelhante a caracterização de Leonardo DiCaprio e Armie Hammer no filme J. Edgar, de Clint Eastwood. Tal característica não desconstrói os pontos positivos do filme, mas é inegável que gera um pouco de desconforto, até por que a atenção fica direcionada a maquiagem e não a composição do ator.

Se por um lado o aspecto visual do filme - direção de arte, figurino e fotografia - apresenta-se primoroso, especialmente a cenografia e figurino, que transportam com propriedade o espectador à época apresentada, a trilha sonora de Danny Elfman (Homens de Preto) simula com certa propriedade os temas de Bernard Herrmann (compositor responsável pela trilha de Psicose), mas acaba pecando pelo excesso e grandiloquência, que acabam chamando mais atenção aos temas do que as imagens. Não é sempre que Elfman se empolga, mas em alguns momentos isto ocorre e o resultado é um tanto incômodo (pelo menos aos ouvidos).

Um filme leve, recheado de referências, que conta com um elenco de primeira categoria e uma direção discreta, mas eficiente, Hitchcock não entrega nem mais, nem menos do que o previsto, encontra sua força em seu elenco e técnica e cumpre sua função principal: entreter. Poderia ser ainda mais referencial e complexo? Certamente. Contudo, pretensões e expectativas à parte, o filme conduzido por Sacha Gervasi cumpre seu papel e sagra-se como uma obra gostosa de se ver, além de despertar a atenção dos não iniciados à filmografia de um dos grandes nomes do cinema de todos os tempos: o enigmático Alfred Joseph Hitchcock.

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24 maio, 2013

A Morte do Demônio (The Evil Dead, EUA, 1981).

"O filme de horror mais 'ferozmente' original do ano..." (Stephen King, autor de Carrie e O Iluminado).
Uma coisa é certa: A Morte do Demônio é um filme "tosco", mas distante de ruim. Obra primeira do hoje consagrado Sam Raimi (Homem Aranha, Oz: Mágico e Poderoso), o filme realizado com parcos recursos, mas dono de uma inventividade absurda por parte de Raimi e de sua equipe de técnicos, desperta atenção do começo ao fim, mesmo tendo uma estrutura narrativa bastante similar a outras obras consideradas basilares à época, como o também clássico O Massacre da Serra Elétrica (1974), de Tobe Hooper. Por sinal, é mais do que notório que Raimi, ao lado de caras como John Carpenter (À Beira da Loucura), Wes Craven (A Hora do Pesadelo) e do próprio Hooper, seja considerado um dos pais do trash e do gore "mainstream", devido ao grande alcance de suas obras e o respaldo das mesmas perante a comunidade cinéfila, especialmente esta A Morte do Demônio

É certo que até para a época os efeitos especiais e de maquiagem do filme não apresentam grande qualidade, mas tais imperfeições são compensadas pelo ótimo clima empregado pelo diretor, que não utiliza apenas o artifício dos sustos inesperados, mas também a escatologia e, principalmente, a ambientação, que proporciona um maior envolvimento do espectador para com as personagens apresentadas. Infelizmente, o elenco do filme é muito fraco (inclusive o amuleto do diretor, Bruce Campbell), o que prejudica bastante a verosimilhança para com o "mundo real" (leia-se: catarse). Por outro lado, essa "falha" acaba por ajudar em outra proposta do filme: o humor negro. Construído como um meio termo entre horror sanguinolento e humor físico e negro, A Morte do Demônio pode não sagrar-se perfeito em cada uma destas abordagens, mas a mescla de ambas tornam o filme um exemplar único, ainda mais se consideramos à época em que o mesmo foi lançado.

Talvez o maior destaque de A Morte do Demônio resida na técnica de filmagem/composição aplicada por Saim Raimi, que aproveita como poucos o fato de não possuir um grande orçamento ou recursos técnicos de ponta para conduzir a narrativa do filme de modo a priorizar o clima de tensão e suspense, utilizando com bastante propriedade a câmera subjetiva e os enquadramentos (em especial, o close), além de saber quando "pirar" de vez com a exploração mais do que clara de sangue e vísceras. Há problemas na estrutura narrativa do filme, em especial no âmbito de roteiro - uma das perguntas que ecoa é o por que da não "demonização" do personagem Ash, já que todos os outros são "possuídos" pela entidade (ou entidades) demoníacas - , que possui seus furos. Contudo, apesar das falhas, a condução de Raimi é tão bacana que as falhas estéticas e estilísticas acabam em segundo plano, até por que a finalidade maior do filme é cumprida com sobras: conquistar a atenção do espectador, seja através do humor "involuntário" ou do horror que as situações apresentadas despertam.

Transpirando criatividade por trás das óbvias limitações técnicas, Sam Raimi constrói com A Morte do Demônio uma obra referencial do gênero horror, que viria a inspirar diversos cineastas e roteiristas por anos a fio - uma prova recente é o filme O Segredo da Cabana, escrito por Joss Whedon (Os Vingadores) e dirigido por Drew Goddard (Cloverfield) -, marcando uma abordagem peculiar do gênero, abrindo as portas tanto para a "popularização" do horror "sanguinolento" (Jogos Mortais e O Albergue que o diga) quanto para a ironia e o sarcasmo dentro do próprio gênero (que seria revisitado por Raimi em 2007, com o também ótimo Arraste-me Para o Inferno). A Morte do Demônio não é um filme redondo, pois possui alguns sérios problemas de roteiro e de "lógica" cinematográfica - não me refiro a realismo -, mas suas qualidades superam qualquer vacilo por parte da produção, ainda mais se levarmos em conta a precariedade e amadorismo - à época - da equipe responsável pelo filme. O filme pode não ser perfeito, mas é um clássico do gênero.

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20 maio, 2013

Mama (ESP/CAN, 2013).


O diretor, roteirista e produtor mexicano Guillermo Del Toro (Hellboy) sempre teve um bom faro para encontrar boas histórias e, desde que conquistou espaço garantido na sempre complicada indústria de cinema norte-americana, vem ajudando novos cineastas a realizarem seus projetos, quase todos no âmbito do suspense/horror. Certamente, alguns desses apadrinhados de Del Toro, apesar do esforço, não atingiram  um patamar de qualidade que se aproximasse da do mexicano e, infelizmente, o cineasta argentino Andy Muschietti e sua obra Mama encontram-se no grupo das promessas não cumpridas, pois o bom argumento de seu filme acabou sendo mal aproveitado nas cerca de uma hora e quarenta minutos de projeção.

Na verdade extensão de um curta produzido anteriormente por Muschietti, Mama é um filme de horror dono de um visual bacana - uma espécie de casamento entre a estética de Tim Burton, Sam Raimi e do próprio Del Toro -, muito bem fotografado por Antonio Riestra e, como já adiantado, de premissa interessante, que envolve a presença de um "fantasma" preso a nossa realidade devido a um "assunto mal resolvido" em vida - dito assim parece qualquer coisa, mas o argumento gera algumas boas e criativas sacadas - que acaba por "adotar" duas garotinhas, transformando-as drasticamente. O filme também nos apresenta aos personagens de Nikolaj Coster-Waldau (o Jaime Lannister da série Game of Thrones) e Jessica Chastain (A Hora Mais Escura), que assumem a responsabilidade da guarda das crianças (o personagem de Waldau é irmão gêmeo do falecido pai das meninas) e com isso os problemas advindos pela presença de Mama, como é denominada a entidade do além.

O grande problema do filme surge exatamente dos enxertos à trama adicionados pelos roteiristas Neil Cross (série Luther), Bárbara Muschietti e pelo diretor Andy Muschietti. Diversos elementos dispostos à trama não casam bem, alguns destes inclusive dificultam o pleno entendimento do mesmo. O prólogo do filme, apesar de contar com um clima de urgência interessante e ter o potencial de chocar o público, pouco ou nada acrescenta ao desenvolvimento da trama. A motivação de alguns personagens - a exemplo da falta de direcionamento lógico do estudo do psiquiatra interpretado por Daniel Kash, que culmina em uma visita sua a uma casa abandonada no meio da noite (tal visita poderia ser realizada a qualquer momento do dia) - também é questionável, sendo talvez a mais coerente a da personagem de Jessica Chastain, uma roqueira pouco afeta as convenções de "papai e mamãe" (não me refiro a sexo) que, numa espécie de mini jornada do herói, acaba por transcender e passa a se portar como uma verdadeira mãe. Entretanto, reputo este bom desenvolvimento mais ao desempenho da atriz (já considerada uma das mais talentosas da atual safra) do que ao cuidado do roteiro.

Há uma tentativa de inferir um caráter psicológico para preencher algumas lacunas do filme, mas este não é bem aplicado, especialmente pelo excesso de informações descartáveis aplicadas ao roteiro, que acaba por "esquecer" de apresentar as óbvias, tais quais como Mama conseguiu ficar presa ao mundo terreno e, afinal de contas, qual era seu objeto em "vida" (louca ou não, todos tem um objetivo). O sentimento despertado pelo filme é dúbio, pois indiscutivelmente há coisas boas neste primeiro longa-metragem de Andy Muschietti, mas a maioria se perde no meio do caminho e acaba sendo resolvida de maneira estranha, sem clareza ou objetividade. O clima do filme é eficiente, mas seu enredo não se sustenta de forma perene, o que acaba tirando o espectador do universo construído, aspecto este perigoso para um filme que propõe a imersão a um universo fantástico, mas crível.

Mais interessante pelo visual inspirado e pela qualidade do elenco, Mama pode até agradar aqueles que buscam um filme de atmosfera peculiar e que conduza o espectador por "descobertas" e "sustos", mas os pequenos solavancos entre uma camada e outra do filme pode provocar certo desinteresse, especialmente pela pretensão da trama, que poderia ter sido formatada de forma muito mais compacta e, por conseguinte, interessante. Mais próximo de produções assinadas por Del Toro como Não Tenha Medo do Escuro e Os Olhos de Julia, do que de O Orfanato, por exemplo, Mama não é um filme ruim ou descartável, mas fica a dever pelas inseguranças apresentadas, que o tornam menos interessante do que sua premissa adiantava.

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13 maio, 2013

O Júri (Runaway Jury, EUA, 2003).


"Julgamentos são muito importantes para ser decididos por júris" (Livre tradução da frase disposta no poster promocional do filme).
Apesar de bastante fantasioso, O Júri, de Gary Fleder (Beijos Que Matam) é um filme muito divertido, em grande parte devido ao esmero de seu elenco, especialmente da vitalidade de Gene Hackman (Operação França) e Dustin Hoffman (Todos os Homens do Presidente). Adaptação de uma obra de John Grisham, o filme trata do embate entre um civil contra uma poderosa indústria de armas de fogo e das manobras por trás da formação de um júri. É inegável que existem "esquemas" para favorecer A ou B em tudo que é instituição, mas as frentes lideradas pelos personagens de John Cusack (1408) e Rachel Weisz (O Legado Bourne) e, em contraposição a estes, a do personagem de Hackman, são tão milimetricamente planejadas e com rompantes de autossustentabilidade (leia-se: segurança absoluta) que não convencem como fato real, palatável, crível. Com isso, não digo que tal característica do roteiro não faz o filme funcionar, pois seria uma baita de uma mentira, mas isso não quer dizer que tal elemento não transfira o caráter "realista" do filme para a assertiva "só em filme isso é possível".

Deixando o binômio "crível / não crível" um pouco de lado, é preciso destacar a competência da produção em conduzir este thriller eficiente, que divide com sucesso o tempo dedicado as deliberações no Tribunal e as incursões mirabolantes fora do mesmo. Gary Fleder comanda com pulso a produção e não se esquiva de dar o máximo de destaque ao quarteto principal (Hackman, Hoffman, Cusack e Weisz), mesmo que acabe pendendo mais para os dois primeiros - ou a aura de ambos é tão grande que, independentemente de "favorecimento" ou não, estes sempre se destacam? -, até por que reconhece a qualidade do mesmo e que a plateia depende da empatia com estes para comprar uma trama que, como dito acima, vez ou outra acaba beirando ao absurdo.

No entanto, apesar de não comprometer o longa em momento algum, a impressão que se dá é que, caso o filme fosse comandado por um diretor com mais bagagem, o filme poderia ser ainda melhor, já que Fleder, competência à parte, não possui uma marca autoral ou um estilo particular de dirigir, inclusive construindo o filme de forma um tanto quanto genérica, sem diferenciá-lo de produções outras do gênero. O Júri acabou sendo aclamado por muitos como o melhor filme baseado em uma obra de Grisham desde A Firma, de Sidney Pollack (Entre Dois Amores) - estrelado por Tom Cruise -, mas creio que esta afirmação é um tanto quanto exagerada, pois no final das contas, apesar de O Júri ser um filme eficiente e divertido, não se difere em abordagem, estilo e execução de tantas obras do gênero. Particularmente, ainda fico com Tempo de Matar (Joel Schumacher) e o próprio A Firma como os mais interessantes filmes-adaptações de obras de John Grisham.

Tecnicamente o filme é bem acabado, pois é dono de um ritmo interessante - bom trabalho do montador William Steinkamp (Tootsie) - e uma trilha sonora discreta, mas que pontua com precisão os momentos de maior impacto dramático - responsabilidade de Christopher Young (A Entidade). A fotografia ficou a cargo do oscarizado Robert Elswit (Sangue Negro), que aposta em um visual sóbrio, porém levemente intimidador, na abordagem visual do filme. Outro destaque se encontra nas figuras de Deborah Aquila (Sete Dias com Marilyn) e Tricia Wood (Os Mercenários), ambas responsáveis pela escalação do elenco, que é, sem sombra de dúvidas, o maior atrativo do filme.

Prestes a completar dez anos, O Júri continua sendo uma obra cinematográfica envolvente e interessante, mesmo que sofra um pouco devido aos excessos de seu roteiro - que, por sinal, passou por quatro pessoas: Brian Koppelman (Treze Homens e um Novo Segredo), David Levien (Cartas na Mesa), Rick Cleveland (série À Sete Palmos) e Matthew Chapman (A Tentação), o que quase nunca é uma boa notícia - e que não desenvolve tanto a crítica contra a indústria armamentista. O enredo, apesar de surreal, é desenvolvido a contento e tem tudo para entreter o telespectador, mas o grande barato é esperar o diálogo climático entre os personagens de Hoffman e Hackman, que assim como Al Pacino e Robert De Niro em Fogo Contra Fogo, possuem apenas uma cena juntos, mas esta acaba fazendo as duas horas de filme valerem ainda mais a pena.

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12 maio, 2013

A Vida de David Gale (The Life of David Gale, EUA/ALE/ING, 2003).


"Uma vida sem princípios não é uma vida em sua completude" (Livre tradução da frase disposta no poster promocional do filme).

As vezes o posicionamento político de um filme o salva do lugar comum, todavia, algumas vezes este acaba por sepultar uma boa ideia ou uma discussão pertinente. E, infelizmente, A Vida de David Gale, do veterano Alan Parker (Pink Floyd - The Wall), encaixa-se nesta última categoria. Contando com um bom elenco, onde destacam-se destacar Kevin Spacey (Se7en, os Sete Crimes Capitais), Kate Winslet (Deus da Carnificina), Laura Linney (O Show de Truman) e Gabriel Mann (A Identidade Bourne), possuidor de um clima e uma premissa inicial interessantes, que mistura com competência o senso de suspense a uma trama que alude à questão da pena de morte em alguns estados dos Estados Unidos da América (a bem verdade, o recorte feito é no estado do Texas, cenário do filme). Contudo, o que até metade do filme parecia uma crítica ferrenha contra esta prática acaba se revelando um baita de um embuste, pois acaba por distorcer não apenas o discurso empregado durante todo o filme até então, como também o faz de forma implausível, resultando não apenas num atrito ideológico, como também no possível afastamento do espectador à trama, pois o efeito negativo da virada do filme possivelmente o tirará do filme.

Sendo assim, A Vida de David Gale é, literalmente, formado por duas partes bastante distintas, não congruentes entre si. Quando destaco este corte não me refiro apenas à questão do conteúdo da obra, mas também a abordagem narrativa do mesmo, que também muda. Obviamente que desde o início o tom de suspense prevalecia, contudo, de forma pontual, tendo por finalidade apenas climatizar o espectador, deixá-lo inserido em um ambiente de insegurança e de dúvidas. Entretanto, nos quarenta minutos finais - leia-se: arco de resolução da trama - Alan Parker investe em uma pegada de thriller que não surte um bom efeito, pois se apresenta falso e principalmente sem sentido com o que vinha sendo desenvolvido até então. É muita correria, música alta, ânsia de chega mas não chega, caras e bocas, revelações "bombásticas", enfim, tudo menos a sobriedade e pensamento crítico de outrora. 

Em resumo, de filme reflexivo e contundente, A Vida de David Gale passa a ser um suspense genérico, mais preocupado em apresentar surpresas e reviravoltas (com ou sem sentido, o filme parece não dar a mínima) do que em afunilar a teoria apresentada, deixando os questionamentos e resoluções nos campos ético e moral a cargo do espectador. Com a faca e o queijo no mão, Parker tinha tudo para entregar um filme excepcional, a exemplo de títulos anteriores do diretor britânico, que também carregavam no cerne questionamentos políticos e sociais, como O Expresso da Meia-Noite e Mississípi em Chamas, porém ele e o roteirista Charles Randolph (Amor e Outras Drogas) escorregam na resolução, apostando em uma conspiração implausível, que não apenas descaracteriza todo o movimento contra a pena de morte, como também destrói, moralmente e como efeito de mártir, a dupla de personagens de Spacey e Linney e o importantíssimo movimento social do qual estes faziam parte.

Obviamente o filme não é um completo desastre - apesar do seu desfecho "queimar" a obra drasticamente -, pois traz a tona um debate interessante (embora a filosofia apresentada pela obra seja, no mínimo, eticamente falha), tem bom ritmo, boas atuações e é filmado com competência, contudo, sua resolução é trôpega, não por ser nebulosa, mas por tomar um partido que não se adéqua ao proposto de início. Há uma inversão de conceitos. O que o filme defende é a pena de morte ou a extinção da mesma? A sociedade daquela região norte-americana é alienada ao ponto de ratificar a pena de morte como solução e necessidade ou há coerência neste pensamento? Os "heróis" do filme na verdade não passam de "bandidos" ou, na verdade, são "vilões mocinhos"? Esta ruptura à coerência narrativa do filme até então não convence, surgindo mais como um artifício para "chocar" o telespectador do que como desfecho orgânico aos acontecimentos apresentados de forma prévia. Em síntese, A Vida de David Gale não é um filme ruim, mas tinha um potencial gigantesco que é autossabotado pela falsa necessidade de uma virada "imprevisível" na trama (a bem verdade, são duas viradas) e pelas incongruências de suas ideias. Parafraseando Paulo Ricardo, "é muita informação e pouco conteúdo". Ao meu ver, Alan Parker perdeu a mão neste filme - não à toa o diretor não filme outro longa-metragem desde então - e, para aqueles que apreciam obras de conjuntura político-discursiva, sugiro que assistam aos filmes O Expresso da Meia-Noite e Mississípi em Chamas, obras estes com muita mais pungência e coerência que este A Vida de David Gale.

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11 maio, 2013

Paul - O Alien Fugitivo (Paul, ING/EUA, 2011).

"Quem está afim de um encontro?" (Livre tradução da frase disposta no poster do filme).
Uma comédia sci-fi escrita e estrelada pelos britânicos Simon Pegg (Star Trek) e Nick Frost (As Aventuras de Tintim), dirigida pelo competente Greg Mottola (Superbad - É hoje!) e produzida pelos responsáveis pelos ótimos filmes Todo Mundo Quase Morto e Chumbo Grosso, em teoria, não tinha como dar errado. E, apesar de não ser uma obra incrível, Paul - O Alien Fugitivo (mais um subtítulo descartável acoplado à versão brasileira do filme) é divertido e recheado de referências nerds (a premissa do filme envolve dois nerds ingleses visitando a Comic-Con, em San Diego, no estado da Califórnia).

Não tão equilibrado quanto as comédias tipicamente britânicas - este filme, apesar de ser uma produção da Working Tittle, contou com grande influência da indústria de cinema norte-americana -, Paul - O Alien Fugitivo perde um pouco no sentido cômico - a bem verdade, o filme é pouco engraçado -, mas funciona bem como uma aventura leve e despretensiosa, especialmente pelo carisma e talento do elenco, que é complementado por Jason Bateman (Hancock), Kristen Wiig (Missão Madrinha de Casamento), Bill Hader (Ressaca de Amor), Jane Lynch (O Virgem de 40 Anos), Joe Lo Truglio (Faça o Que eu Digo, Não Faça o Que eu Faço), Sigourney Weaver (Alien, o 8º Passageiro) e Seth Rogen (Ligeiramente Grávidos), que interpreta (voz) o personagem título.

O roteiro de Pegg e Frost se agarra bastante ao universo das referências, que perpassam desde produções ligadas a ficção-científica, até outras que perpassam as temáticas nerd. Estão lá Star Wars, Star Trek, E.T. - O Extraterrestre, Homens de Preto, Contatos Imediatos do Terceiro Grau, literatura pulp etc. Contudo, apenas o cabedal de referências e citações não tornam o filme um filme e acredito que esta estrutura - e o plot um tanto quanto óbvio - tornaram a obra mais próxima a uma coleção de esquetes do que uma obra concisa, com início, meio e fim. Apesar de não ser tão engraçado ou inventivo, o filme funciona, porém não pelo roteiro em si, mas sim pela qualidade do elenco, pela direção segura de Mottola e pelo carisma da personagem-título, que nada mais é do que um alienígena construído em computação gráfica (razoável) com a personalidade de Seth Rogen (que faz rir, mas interpreta - mais uma vez - a si mesmo).

Despretensioso, mas competente em sua proposta, Paul - O Alien Fugitivo não soa tão engraçado quanto outros filmes protagonizado pela dupla Pegg/Frost ou até mesmo por aqueles que envolviam nomes como Bateman, Wiig, Hader ou Lynch, mas não decepciona, pois ganha força no quesito aventura e, apesar de alguns momentos óbvios, guarda um final bacana e, de certa forma, surpreendente. Certamente não é um grande filme, mas sim uma bobagem (no bom sentido) gostosa de se assistir.

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05 maio, 2013

Em Algum Lugar do Passado (Somewhere in Time, EUA, 1980).


"Em algum dia do passado ele a achará..." (Livre tradução da frase no poster do filme).

Em Algum Lugar do Passado pode ser categorizado como um filme limítrofe, entre o adocicado e o romântico utópico, conseguindo emanar uma aura de inocência e desapego à concretude de forma centrada, até por que não há como aproveitar a jornada proporcionada pela obra sem deixar o lado racional um tanto adormecido. Pouco preocupado em desenvolver as personagens e seus dilemas de forma profunda, o mote do filme de  Jeannot Szwarc (Tubarão 2) é o amor como abstração, é a tradução do conceito de alma gêmea em forma de imagem, é a exposição de um sentimento invalorável e a dependência que todo ser humano possui do mesmo, seja lá como este o conceba.  

Estrelado por duas das figuras mais belas da época, o então Superman Christopher Reeve (Superman, o Filme) e Jane Seymour (007 - Viva e Deixe Morrer), que fisicamente lembrava bastante a diva Vivian Leigh (...E o Vento Levou), Em Algum Lugar do Passado conta com roteiro do escritor Richard Matheson, que aqui adapta uma obra de sua própria autoria - Bid Time Return - e, se não é um primor em termos técnicos, consegue envolver o espectador a ponto das várias interrogações quanto a viabilidade da viagem ao tempo e, principalmente, de como o romance entre Richard Collier (Reeve) e Elise McKenna (Seymour) teve início. Do passado ao presente? Do passado ao futuro? Do presente ao passado? Tais perguntas não são respondidas, muito menos exploradas, mas a magia proposta pelo filme cumpre bem seu papel e não deixa essas lacunas estragarem a boa sensação obtida ao se assistir ao filme.

Talvez o filme não pegasse tanto caso a química entre Christopher Reeve e Jane Seymour não existisse, especialmente o primeiro, que está presente em cena em praticamente todo o filme. Reeve consegue utilizar muito bem seu físico imponente à sua forma de interpretar, além de mostrar-se um ator versátil, competente tanto nos momentos de cunho mais cômico, quanto nos mais dramáticos. Seymour não tem tanto tempo para compor sua personagem, por isso deixa sua beleza liderar em cena, contribuindo assim para que o sentimento apresentado pelo casal torne-se crível, mesmo que desenvolvido de forma bastante apressada - especialmente no caso dela.

Como dito no início do texto, o filme vez ou outra beira o melodrama apelativo, muito devido a trilha sonora alta e melosa composta pelo veterano John Barry (Moscou Contra 007) e pelo estilo de filmar da diretora Jeannot Szwarc, que parece casar perfeitamente com os temas "exagerados" de Barry, visto que ela gosta de tomadas lentas e enquadramentos em perfeita simetria, utilizando bastante reflexos e espelhos como elementos narrativos, além de casamento entre quadros distintos. Particularmente achei elegante sua maneira de filmar, pois me faz lembrar o cinema clássico hollywoodiano. No entanto, ao julgar a cotação atual do agregador de críticas Rotten Tomatoes, a crítica especializada parece torcer o nariz para o filme, o que ao meu ver é uma baita bobagem, pois ele, apesar de alguns deslizes comuns a praticamente todos os filmes do período que divide as décadas de 1970 e de 1980, é bem realizado e a rigor cumpre seu papel como filme romântico, alcunha que toma durante todo o tempo, nunca fugindo do que é em essência.

Inspirador de títulos como A Casa do Lago (2006) e Te Amarei para Sempre (2007), Em Algum Lugar do Passado deve ser visto como um filme de sua época que procura evocar valores anteriores a mesma, equacionando o amor como sentido da vida, independentemente de racionalizações ou ideologias. Apesar da premissa aparentemente complexa - o filme trata de uma viagem temporal apoiada em uma técnica de hipnose atestada por um professor de filosofia -, a obra é de uma simplicidade e inocência ímpar e não se preocupa em apresentar respostas para as perguntas formuladas, mas sim em traduzir através de metáforas visuais, utilizando dois agentes, o poder do amor e da busca pelo mesmo, que tanto pode construir como construir e ambos os cenários são apresentados pelo longa, que revela um desfecho ao mesmo tempo angustiante e metafísico, onde a recompensa é alcançada, a depender da crença de cada espectador. Em Algum Lugar do Passado é um filme simples e bonito, mas nunca desinteressante.   

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Lincoln (EUA, 2012).


O maior pecado de Lincoln, cinebiografia que retrata uma pequena - mas importante - parte da história de um dos maiores presidentes dos Estados Unidos da América, encontra-se no seu convencionalismo, visto que sua construção se dá de forma tão calculada e pragmática que o caráter surpresa praticamente é inexistente. Mais um retrato da batalha (literalmente) política para a aprovação da 13ª emenda à Constituição, que visava abolir a escravidão no país, do que uma biografia completa do então presidente, a obra dirigida por Steven Spielberg (Cavalo de Guerra) cumpre bem seu papel como filme-homenagem/enaltecedor, apresentando um personagem-título convincente, muitíssimo carismático e hipnotizante e transportando o telespectador ao século XIX com competência, devido a sua óbvia qualidade técnica. Porém, apesar da qualidade técnica e da "boa vontade" dos realizadores, nem sempre o filme empolga e a sua longa duração tem muito a ver com isso.

Contando com um casting fenomenal, em grandes ou pequenos papeis, o filme carrega muito de seu interesse na qualidade de seu elenco, apesar de Sally Field (Forrest Gump - O Contador de Histórias), que seja pelo exagero de suas técnicas de interpretação ou simplesmente por seguir as instruções de Spielberg e Tony Kushner (roteirista) acaba construindo uma personagem absolutamente antipática, irritante e desmotivada, tornando-se assim numa lacuna bastante acentuada as pretensões do filme. Todavia, se Field não agrada (por qual motivo a veterana atriz foi indicada ao Oscar como melhor atriz?), Tommy Lee Jones (Homens de Preto), David Strathairn (O Ultimato Bourne) e James Spader (Crash, Estranhos Prazeres) realizam um grande trabalho na composição de seus determinados personagens, empregando personalidade e despertando interesse pelos mesmos, que acabam servindo como pontes para o desempenho irretocável (e, por que não, friamente calculado) do monstro Daniel Day-Lewis (O Último dos Moicanos).

O que comentar acerca da transformação de Day-Lewis? Da composição de voz às expressões faciais, passando pela forma de andar e pela personalidade praticamente inabalável empregada, o ator britânico simplesmente transforma a figura histórica, mitológica e icônica de Lincoln em realidade, tamanho o empenho empregado pelo ator, que apresenta uma performance que transcende, dando a entender que o que acompanhamos não é nem de longe uma interpretação, mas sim o próprio presidente. O trabalho de Day-Lewis é tão hipnotizante e de qualidade que nem o reforço - muitas vezes exagerado - empregado por Spielberg, com suas tomadas e movimentos de câmera calculados para enaltecer e/ou destacar o personagem, atrapalha a relação entre este e o público, o que é mais uma prova do magnetismo do trabalho do ator. Resultado? Oscar para sua atuação (esse sim, apesar da ótima concorrência, merecidíssmo).

Dois outros pontos que merecem destaque são a fotografia primorosa de Janusz Kaminski (O Resgate do Soldado Ryan), que usa (ou emula) bastante luzes naturais, aproveitando sombras e silhuetas, o que reforça a concepção de época do filme. Seus enquadramentos e planos também são formatados de maneira absurdamente calculada (no bom sentido), dando uma qualidade estética elevadíssima ao filme. É certo que, aliado a Spielberg, Kaminski tenta reforçar, a todo momento, a grandiosidade e poder de empatia/carisma da persona/interpretação de Lincoln/Daniel Day-Lewis, o que pode soar exagerado, mas que pelas mesmas razões citadas acima, não conseguem diminuir o conjunto da obra. Outro que surge bem, principalmente por apresentar-se contido, é o maestro John Williams (Superman, o Filme), que deixa de lado - pelo menos neste filme - as grandes orquestrações e temas chorosos e aposta em composições de cunho mais intimista, baseada no piano, complementando as imagens do filme, ao invés de surgir como mais um personagem. Creio que, apesar de não ser um grande destaque, a trilha dá um bom suporte ao filme, mesmo que de forma discreta (aspecto este cada vez mais raro no cinema contemporâneo).

O roteiro de Tony Kushner, apesar de competente - cinematograficamente falando -, perde um pouco de força pela falta de background, pois muitas das personagens que desfilam em tela são apenas jogadas, reforçando o caráter "histórico" da produção, mas dificultando o entendimento da importância das mesmas ao contexto geral do filme. Sendo assim, alguns personagens são muitíssimo bem aproveitados (os de Lee Jones e Spader, por exemplo), enquanto outros aparentemente fundamentais não o são, como os de Joseph Gordon-Levitt (Batman, o Cavaleiro das Trevas Ressurge). A decoupagem do roteiro também poderia ter sido vista com mais cuidado, pois certamente o ponto mais frágil dele é o seu desfecho, que não tem tanta relevância para com o cerne da trama - a abolição da escravatura -, independentemente do título do filme ser o sintético e restritivo Lincoln. Some-se a esses pequenos entraves do roteiro a montagem "preguiçosa" de Michael Kahn (As Aventuras de Tintim), que ocasionou numa duração um tanto alargada do filme (se o desfecho tivesse sido limado e surgisse apenas de forma descritiva, antes dos créditos do filme, o resultado seria uma obra com pelo menos quinze minutos a menos, uma infinidade a depender do filme). Mas como dito no parágrafo inicial, um dos males que toma Lincoln, a obra cinematográfica, é o excesso de convencionalismo, seja no tratamento conceitual, seja nas técnicas de condução da obra, o que por si só não é um fator de demérito, mas também não tornam o filme mais interessante. De certa forma o torna frio, comum, o que provavelmente não era o pretendido pelos realizadores.

É certo que Steven Spielberg é um diretor de mão cheia e aqui não poderia mostrar algo diferente de sua habitual expertise técnica. O diretor faz, como habitual, um trabalho irretocável no que tange ao visual, a direção de atores - à exceção de Sally Field - e à mitificação de seus personagens, mas em contrapartida se junta a sua equipe no quesito comodismo, não aplicando um diferencial que destaque o filme de outros épicos que tratam de eventos históricos à história de formação sócio-político-cultural do povo norte-americano, muito pelo contrário, a impressão que se dá é que o simples fato da obra possuir o "passe" de um dos atores mais completos da história do cinema resultaria, de forma automática, numa obra-prima instantânea, o que (infelizmente) não é o caso aqui. Lincoln é um bom filme e tem seus méritos, mas também peca em muitos pontos, muitos destes não pela falta de competência dos envolvidos, mas simplesmente pela falta de ousadia, de inspiração. Sendo assim, apesar de uniforme e interessante cinematograficamente, o filme certamente não constará nos anais de grandes clássicos, o que é uma pena, tanto pela força em potencial do filme em si, quanto pela força simbólica do personagem título. Mais do que um filme de Steven Spielberg, Lincoln acabará sendo lembrado como o filme de Daniel Day-Lewis, o que infelizmente não é o suficiente para torná-lo uma obra referencial, não é mesmo?

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01 maio, 2013

Operação Invasão (Serbuan Maut / The Raid Redemption, IND, 2012).

"Um implacável chefão do crime. 20 policiais de elite. 30 andares de caos" (Livre tradução do texto disposto no cartaz oficial do filme).
Certamente não há rompantes de profundidade neste Operação Invasão, produção da Indonésia que fez bastante barulho em festivais de cinema ao redor do globo, mas em contrapartida é, inquestionavelmente, uma das grandes surpresas dos gêneros policial/ação nos últimos anos, tanto pelo estilo próprio de abordagem - que mistura o visual moderno com uma violência visceral, utilizando muito bem os efeitos digitais como complemento à ação - quanto pela proposta em si, já que transforma uma trama de invasão a um prédio, simples e batida, num festival de tensão e interesse. Tudo isso sem contar com um grande orçamento, astros internacionais ou um diretor conhecido. No fim, nada disso importa, pois o grande barato do filme encontra-se nesta imprevisibilidade apresentada. Espécie de mangá/anime live-action - apesar de não ser uma obra japonesa ou uma adaptação de uma obra deste país -, o filme é, sem sombra de dúvidas, uma das melhores produções de ação lançadas nos últimos anos.

O diretor e roteirista Gareth Evans se apresenta aqui como um talento latente, visto que mostra um raro equilíbrio entre inventividade e coerência narrativo-visual, construindo os três arcos da trama de maneira clara e dinâmica, além de aplicar um estilo de filmagem bastante peculiar, possivelmente influenciado pela geração de cineastas "surgidos" no início dos anos 2000, como Antoine Fuqua, Zack Snyder, Guy Ritchie e até mesmo Fernando Meirelles (por conta do seu Cidade de Deus). É claro que esta referência encontra-se apenas na composição visual, até por que Operação Invasão tem um enredo bastante característico e, como dito acima, não está lá preocupado em construir uma trama com ecos de profundidade, mas sim investir em tensão e agonia como o objetivo de amplificar a ação proposta pelo filme.

Apesar do estilo de Evans se encaixar muito bem em todos os setores da produção, é impossível não destacar sua composição das cenas de lutas marciais, que além de muitíssimo bem coreografadas, são captadas de forma a proporcionar uma imersão quase que total do espectador naquele ambiente, aumentando assim o impacto das mesmas, além de garantir certa realidade às cenas. É óbvio que, como a maioria dos filmes que possuem os combates marciais como elemento narrativo, convenções são aplicadas e temos aqui as mesmas lutas de um indivíduo contra vários oponentes, mas a construção da tensão ao redor das sequências é tão bem bolada, que o convencional torna-se novo, contribuindo assim para o selamento do sucesso do filme.

Aplaudido em festivais de renome mundial, como Sundance e Toronto, Operação Invasão transformou-se rapidamente uma sensação cult - inclusive despertando o interesse da "sapiente" Hollywood para uma refilmagem -, mas que infelizmente não se refletiu em um grande sucesso de bilheteria, apesar do grande potencial. Finanças à parte, eis que Operação Invasão surge como mais uma prova de que o cinema de gênero encontra-se cada vez mais internacional e universal, onde uma produção bancada e filmada na até então inexpressiva (cinematograficamente falando) Indonésia consegue superar grandes títulos norte-americanos, ingleses e franceses (para ficar nos mais óbvios) do gênero, tanto em qualidade técnica, quanto no âmbito narrativo, utilizando uma premissa simples (e, por que não, óbvia) e construindo um verdadeiro pandemônio de eventos, que pode até cansar um pouco a audiência devido ao confinamento envolto em quase toda a obra, mas que não deixa de ser muito bem apresentado. Um filme de ação sem papas na língua ou remorso de mostrar-se violento, seria um bom resumo a este primeiro trabalho do hoje provavelmente bastante sonsado Gareth Evans.

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